Esses dias uma amiga de infância me convidou para sua formatura em Educação Religiosa, e eu fiz em seu Orkut uma pergunta que ficou sem resposta até agora: Educação Religiosa tem alguma coisa a ver com honestidade?
O Estado é laico e assim deveria ser também a Escola pública, mas aqui no Rio de Janeiro uma lei absurda da ex-desgovernadora Rosinha Pocotó instituiu as aulas de Religião nas escolas estaduais. Que, como diz a LDB, não podem ser obrigatórias, mas nenhuma direção tem a decência de dizer isso aos estudantes e nem o dizem o(a) professsore(a)s de religião, sob risco de ficarem com as salas vazias (jogar futebol, peteca, brincar de pique, beijar na boca etc são atividades mais interessantes). E aí, a pergunta que não quer calar: como ficam os direitos dos ateus, agnósticos e hereges em geral? Porque a liberdade religiosa é também a liberdade de não ter religião.
Mais: como dá pra conciliar dogmas que dizem que Deus criou o mundo em seis dias com as descobertas da Ciência que apontam tantas eras geológicas, que levaram milhões de anos cada uma? Como conciliar a Educação Sexual com o obscurantismo bíblico que declara imundo e pecaminoso tudo que diz respeito à sexualidade? Como dizer que o arco-íris é um milagre concedido como lembrança do Dilúvio, quando sabemos que é apenas a fragmentação d aluz do Sol ao passar pelas gotinhas de chuva?
E o que pensarão essas crianças desses professores desonestos quando crescerem e aprenderem na Legislação que foram manipulados pelos interesses obscurantistas das igrejas e de uma escola pública falida? Que lhes negaram a liberdade de escolha?
sábado, 18 de dezembro de 2010
segunda-feira, 29 de novembro de 2010
Vitória sobre o tráfico ou Papai Noel existe
Se eu acreditasse em Coelhinho da Páscoa, estaria aplaudindo de pé as operações nas favelas cariocas de enfrentamento ao tráfico, saudadas pelo jornalismo dependente das verbas estatais como a solução para todos os males. Só os crédulos acreditam que tudo vai continuar assim nos próximos seis meses.
Quando a TV exibe as mansões dos traficantes, as repórteres se deslumbram e fingem gozar de alegria como atrizes de filme pornôs. Por que não mostram as mansões dos fabricantes das armas que o tráfico usa: aqueles bilionários que têm suas ações na Bolsa de Valores de Wall Street, os principais beneficiados com o tráfico de entorpecente e com o combate a esse mesmo tráfico, porque também vendem seus aparelhos de matar aos policiais e aos exércitos de todo o mundo?
Fuzis e granadas não nascem em árvores, mas questionar a procedência deles, o seu nascedouro, é pecado mortal, pois causaria um terremoto nas Bolsas de Valores.
Sendo assim, acabemos logo o tráfico: legalizemos as drogas, pois quem usa não vai deixar de usar em nome do bem público, como ninguém deixou de usar álcool nos anos 20 e 30 nos EUA devido ao puritanismo da Lei Seca. É melhor que os produtores de entorpecentes paguem impostos e assinem a Carteira de Trabalho de seus funcionários, como fazem os produtores de bebidas alcoólicas.
Quando a TV exibe as mansões dos traficantes, as repórteres se deslumbram e fingem gozar de alegria como atrizes de filme pornôs. Por que não mostram as mansões dos fabricantes das armas que o tráfico usa: aqueles bilionários que têm suas ações na Bolsa de Valores de Wall Street, os principais beneficiados com o tráfico de entorpecente e com o combate a esse mesmo tráfico, porque também vendem seus aparelhos de matar aos policiais e aos exércitos de todo o mundo?
Fuzis e granadas não nascem em árvores, mas questionar a procedência deles, o seu nascedouro, é pecado mortal, pois causaria um terremoto nas Bolsas de Valores.
Sendo assim, acabemos logo o tráfico: legalizemos as drogas, pois quem usa não vai deixar de usar em nome do bem público, como ninguém deixou de usar álcool nos anos 20 e 30 nos EUA devido ao puritanismo da Lei Seca. É melhor que os produtores de entorpecentes paguem impostos e assinem a Carteira de Trabalho de seus funcionários, como fazem os produtores de bebidas alcoólicas.
sábado, 6 de novembro de 2010
Palavras de Pepe Mujica, presidente do Uruguai
"Que seria deste mundo sem militantes? Como seria a condição humana se não houvesse militantes?
Não porque os militantes sejam perfeitos, porque tenham sempre a razão, porque sejam super-homens e super-mulheres e não se equivoquem.
Não é isso. É que os militantes não vêm para buscar o seu. Vêm entregar a alma por um punhado de sonhos.
Ao fim e ao cabo, o progresso da condição humana depende fundamentalmente de que exista gente que se sinta feliz em gastar sua vida a serviço do progresso humano.
Ser militante não é carregar uma cruz de sacrifício. É viver a glória interior de lutar pela liberdade em seu sentido transcendente".
Pepe Mujica - Pres. Uruguay
Não porque os militantes sejam perfeitos, porque tenham sempre a razão, porque sejam super-homens e super-mulheres e não se equivoquem.
Não é isso. É que os militantes não vêm para buscar o seu. Vêm entregar a alma por um punhado de sonhos.
Ao fim e ao cabo, o progresso da condição humana depende fundamentalmente de que exista gente que se sinta feliz em gastar sua vida a serviço do progresso humano.
Ser militante não é carregar uma cruz de sacrifício. É viver a glória interior de lutar pela liberdade em seu sentido transcendente".
Pepe Mujica - Pres. Uruguay
Comentário sobre Monteiro Lobato a propósito do texto de Marisa Lajolo; enviado à prof. Iza Gonçalves Quelhas
Querida Iza,
não tenho muito tempo para ver noticiários, mas a discussão sobre o livro de Monteiro Lobato chegou à sala dos professores de uma das escolas em que trabalho. (Deve ter chegado na outra também, mas por motivos de saúde, não estive lá.) É um livro infantil que tornou-se tragédia grega. Sim, Monteiro Lobato é maior nome da literatura infantil brasileira; sim, eu sou contra a censura; sim, eu sou contra o racismo; sim, os livros de Monteiro Lobato estão repletos de ideias racistas e machistas. Não, não podemos tapar o sol com a peneira e fazer de conta que vivemos uma democracia racial.
Emília, a personagem mais popular de Lobato, trata tia Nastácia indecentemente do começo ao fim das estórias (vamos ver isso apenas como uma revolta da criatura contra o criador?) embora D. Benta a repreenda. Mas a própria D. Benta chama Tia Nastácia de negra ignorante em "História do Mundo para Crianças". Em "O Poço do Visconde", ela dorme o tempo todo durante as aulas de Geologia do Visconde e diz que tudo aquilo é só história de "peixe podre", desconsiderando uma discussão fundamental para o futuro do Brasil. Em "Emília no País da Gramática", Quindim, ao explicar o que é estilo diz que, "se um dia Pedrinho se tornar escritor". Tinha que ser o Pedrinho? Por que não a Narizinho? E desgraçadamente Monteiro Lobato, na Revolução Constitucionalista de 1932, dizia que aquela guerra deveria ser não para exigir uma Constituição para o Brasil, mas que São Paulo tinha que aproveitar a ocasião para se emancipar do Brasil, assinando embaixo da opinião rancoroso que dizia que São Paulo era a locomotiva que arrastava os outros estados brasileiros.
Quase diariamente vemos manifestações de racismo em sala de aula. Uma vez em que um livro escolar fazia referência ao texto do Gênesis da Criação do Mundo e queria mostrar aos alunos o poder criador da palavra, eu, para ajudá-los a chegarem onde o autor queria que chegassem, contei a eles a história da Criação do Mundo segundo o candomblé, no qual não se usa a palavra para criar. Os evangélicos taparam os ouvidos. A política de extermínio de pobres e favelados é aplaudida por pobres que não moram em favela. Uma aluna que se diz evangélica esqueceu as lições de amor e dignidade do Evangelho quando eu estava comentando a situação carcerária do país. Comentei a entrevista de uma padre da Pastoral Carcerária que visitou um desses campos de concentração transformados em museu e disse que havia mais conforto lá que nos presídios brasileiros. Ela me perguntou: "E você acha que bandido tem que ter conforto?" Quer dizer, ela acha certo colocar 100 homens onde só deveria caber 30 ou 40!
E os casos de bullying? (Por que não usam o termo nativo "zombaria" ao invés de importar um termo inglês?) Imagine que reforço para as zombarias contra os que são diferentes (negros, favelados etc.) se colocarmos nas mãos de alunos que não têm hábito de leitura nem consciência crítica termos preconceituosos.
Vivemos uma época em que os oprimidos disputam o Estado e seus Aparelhos Ideológicos e tentam eliminar preconceitos seculares. E toda a nossa civilização foi construída sobre preconceitos. Vale lembrar que a Bíblia diz que a mulher tem de ser submissa ao marido (então, seria um ser inferior; razão pela qual eu recuso a me casar, pois advogo a igualdade entre os sexos); que quem faz sexo com pessoas do mesmo sexo tem de ser exterminado; vale lembrar que Gregório de Matos despreza os negros; etc. etc. Não podemos fingir que tivemos um passado de glórias, como diz uma mentira chamada Hino Nacional Brasileiro. E como dizer que o futuro será de paz se o futuro começa agora?
Monteiro Lobato escreveu dessa forma porque, naquela época, não haiva por parte dos governos a ideia de por todas as crianças na escolas, nem um movimento negro tão atuante como hoje. Seus livros alcançavam a classe alta e a classe média. Mas quando suas estórias viraram seriados de TV, os produtores viram que tinham que pegar leve, não podiam ser fiéis aos livros, ou perderiam seus empregos. Da mesma forma, Margaret Mitchell escreveu um clássico chamado "... E o Vento Levou", lançado nos anos 30. Quando, nos anos 90, Alexandra Ripley se dispôs a escrever a continuação, "Scarlett", teve de dar um tratamento todo diferente para os negros do romance.
Marisa Lajolo pode ser uma intelectual competentíssima, mas ela não vive a realidade que eu vivo, trabalhando em escola pública, vendo o fascismo avançar a cada dia, travestido de revelação divina. E quanta gente conquistou cadeiras no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas no último pleito falando contra os direitos humanos? Regurgitando ódio aos presidiários, aos homossexuais, aos ateus, às mulheres pobres que precisam abortar (nenhuma mulher sonha com isso, lembremos sempre)?
Esta não é, cara Iza, uma discussão apenas literária, mas também sociológica.
Atenciosamente,
Edson Amaro
não tenho muito tempo para ver noticiários, mas a discussão sobre o livro de Monteiro Lobato chegou à sala dos professores de uma das escolas em que trabalho. (Deve ter chegado na outra também, mas por motivos de saúde, não estive lá.) É um livro infantil que tornou-se tragédia grega. Sim, Monteiro Lobato é maior nome da literatura infantil brasileira; sim, eu sou contra a censura; sim, eu sou contra o racismo; sim, os livros de Monteiro Lobato estão repletos de ideias racistas e machistas. Não, não podemos tapar o sol com a peneira e fazer de conta que vivemos uma democracia racial.
Emília, a personagem mais popular de Lobato, trata tia Nastácia indecentemente do começo ao fim das estórias (vamos ver isso apenas como uma revolta da criatura contra o criador?) embora D. Benta a repreenda. Mas a própria D. Benta chama Tia Nastácia de negra ignorante em "História do Mundo para Crianças". Em "O Poço do Visconde", ela dorme o tempo todo durante as aulas de Geologia do Visconde e diz que tudo aquilo é só história de "peixe podre", desconsiderando uma discussão fundamental para o futuro do Brasil. Em "Emília no País da Gramática", Quindim, ao explicar o que é estilo diz que, "se um dia Pedrinho se tornar escritor". Tinha que ser o Pedrinho? Por que não a Narizinho? E desgraçadamente Monteiro Lobato, na Revolução Constitucionalista de 1932, dizia que aquela guerra deveria ser não para exigir uma Constituição para o Brasil, mas que São Paulo tinha que aproveitar a ocasião para se emancipar do Brasil, assinando embaixo da opinião rancoroso que dizia que São Paulo era a locomotiva que arrastava os outros estados brasileiros.
Quase diariamente vemos manifestações de racismo em sala de aula. Uma vez em que um livro escolar fazia referência ao texto do Gênesis da Criação do Mundo e queria mostrar aos alunos o poder criador da palavra, eu, para ajudá-los a chegarem onde o autor queria que chegassem, contei a eles a história da Criação do Mundo segundo o candomblé, no qual não se usa a palavra para criar. Os evangélicos taparam os ouvidos. A política de extermínio de pobres e favelados é aplaudida por pobres que não moram em favela. Uma aluna que se diz evangélica esqueceu as lições de amor e dignidade do Evangelho quando eu estava comentando a situação carcerária do país. Comentei a entrevista de uma padre da Pastoral Carcerária que visitou um desses campos de concentração transformados em museu e disse que havia mais conforto lá que nos presídios brasileiros. Ela me perguntou: "E você acha que bandido tem que ter conforto?" Quer dizer, ela acha certo colocar 100 homens onde só deveria caber 30 ou 40!
E os casos de bullying? (Por que não usam o termo nativo "zombaria" ao invés de importar um termo inglês?) Imagine que reforço para as zombarias contra os que são diferentes (negros, favelados etc.) se colocarmos nas mãos de alunos que não têm hábito de leitura nem consciência crítica termos preconceituosos.
Vivemos uma época em que os oprimidos disputam o Estado e seus Aparelhos Ideológicos e tentam eliminar preconceitos seculares. E toda a nossa civilização foi construída sobre preconceitos. Vale lembrar que a Bíblia diz que a mulher tem de ser submissa ao marido (então, seria um ser inferior; razão pela qual eu recuso a me casar, pois advogo a igualdade entre os sexos); que quem faz sexo com pessoas do mesmo sexo tem de ser exterminado; vale lembrar que Gregório de Matos despreza os negros; etc. etc. Não podemos fingir que tivemos um passado de glórias, como diz uma mentira chamada Hino Nacional Brasileiro. E como dizer que o futuro será de paz se o futuro começa agora?
Monteiro Lobato escreveu dessa forma porque, naquela época, não haiva por parte dos governos a ideia de por todas as crianças na escolas, nem um movimento negro tão atuante como hoje. Seus livros alcançavam a classe alta e a classe média. Mas quando suas estórias viraram seriados de TV, os produtores viram que tinham que pegar leve, não podiam ser fiéis aos livros, ou perderiam seus empregos. Da mesma forma, Margaret Mitchell escreveu um clássico chamado "... E o Vento Levou", lançado nos anos 30. Quando, nos anos 90, Alexandra Ripley se dispôs a escrever a continuação, "Scarlett", teve de dar um tratamento todo diferente para os negros do romance.
Marisa Lajolo pode ser uma intelectual competentíssima, mas ela não vive a realidade que eu vivo, trabalhando em escola pública, vendo o fascismo avançar a cada dia, travestido de revelação divina. E quanta gente conquistou cadeiras no Congresso Nacional e nas Assembleias Legislativas no último pleito falando contra os direitos humanos? Regurgitando ódio aos presidiários, aos homossexuais, aos ateus, às mulheres pobres que precisam abortar (nenhuma mulher sonha com isso, lembremos sempre)?
Esta não é, cara Iza, uma discussão apenas literária, mas também sociológica.
Atenciosamente,
Edson Amaro
Marisa Lajolo e o veto a Monteiro Lobato
Minha querida professora Iza me enviou por email um texto da doutora Marisa Lajolo falando da polêmica causada por uma denúncia contra um livro de Monteiro Lobato. Eis o texto, com algumas aspas que acrescentei porque este blog não reconhece o que é grifado em itálico:
"Quem paga a música escolhe a dança?
Marisa Lajolo [1]
“Caçadas de Pedrinho”, de Monteiro Lobato, está em pauta e é bom que esteja, pois é um livro maravilhoso .
Narra as aventuras da turma do sítio de Dona Benta primeiro às voltas com a bicharada da floresta próxima e, depois, com uma comissão do governo encarregada de caçar um rinoceronte fugido de um circo. Nos dois episódios prevalecem o respeito ao leitor, a visão crítica da realidade, o humor fino e inteligente.
Na primeira narrativa, a da caçada da onça, as armas das crianças são improvisadas e na hora agá não funcionam. É apenas graças à esperteza e inventividade dos meninos que eles conseguem matar a onça e arrastá-la até a casa do sítio. A morte da onça provoca revolta nos bichos da floresta e eles planejam vingança numa assembléia muito divertida: felinos ferozes invadem o sítio e –de novo- é apenas graças à inventividade e esperteza das crianças ( particularmente de Emília) que as pessoas escapam de virar comida de onça.
Na segunda narrativa, a fuga de um rinoceronte de um circo e seu refúgio no sítio de dona Benta leva para lá a Comissão que o governo encarregou de lidar com a questão. Os moradores do sítio desmascaram a corrupção e o corpo mole da comissão, aliam-se ao animal cioso da liberdade conquistada e espantam seus proprietários. E, batizado Quindim, o rinoceronte fica para sempre incorporado às aventuras dos picapauzinhos.
Estas histórias constituem o enredo do livro que parecer recente do Conselho Nacional de Educação (CNE), a partir de denúncia recebida, quer proibir de integrar acervos com os quais programas governamentais compram livros para bibliotecas escolares. O CNE acredita que o livro veicula conteúdo racista e preconceituoso e que os professores não têm competência para lidar com tais questões. Os argumentos que fundamentam as acusações de racismo e preconceito são expressões pelas quais Tia Nastácia é referida no livro, bem como a menção à África como lugar de origem de animais ferozes.
Sabe-se hoje que diferentes leitores interpretam um mesmo texto de maneiras diferentes. Uns podem morrer de medo de uma cena que outros acham engraçada. Alguns podem sentir-se profundamente tocados por passagens que deixam outros impassíveis. Para ficar num exemplo brasileiro já clássico, uns acham que Capitu ( D. Casmurro, Machado de Assis, 1900) traiu mesmo o marido, e outros acham que não traiu, que o adultério foi fruto da mente de Bentinho. Outros ainda acham que Bentinho é que namorou Escobar .. !
É um grande avanço nos estudos literários esta noção mais aberta do que se passa na cabeça do leitor quando seus olhos estão num livro. Ela se fundamenta no pressuposto segundo o qual, dependendo da vida que teve e que tem, daquilo em que acredita ou desacredita, da situação na qual lê o que lê, cada um entende uma história de um jeito. Mas essa liberdade do leitor vive sofrendo atropelamentos. De vez em quando, educadores de todas as instâncias – da sala de aula ao Ministério de Educação- manifestam desconfiança da capacidade de os leitores se posicionarem de forma correta face ao que lêem .
Infelizmente, estamos vivendo um desses momentos.
Como os antigos diziam que quem paga a música escolhe a dança, talvez se acredite hoje ser correto que quem paga o livro escolha a leitura que dele se vai fazer. A situação atual tem sua (triste) caricatura no lobo de Chapeuzinho Vermelho que não é mais abatido pelos caçadores, e pela dona Chica-ca que não mais atira um pau no gato-to. Muda-se o final da história e re-escreve-se a letra da música porque se acredita que leitores e ouvintes sairão dos livros e das canções abatendo lobos e caindo de pau em bichanos . Trata-se de uma idéia pobre, precária e incorreta que além de considerar as crianças como tontas, desconsidera a função simbólica da cultura. Para ficar em um exemplo clássico, a psicanálise e os estudos literários ensinam que a madrasta malvada de contos de fada não desenvolve hostilidade contra a nova mulher do papai, mas – ao contrário- pode ajudar a criança a não se sentir muito culpada nos momentos em que odeia a mamãe, verdadeira ou adotiva...
Não deixa de ser curioso notar que esta pasteurização pretendida para os livros infantis e juvenis coincide com o lamento geral – de novo, da sala de aula ao Ministério da Educação—pela precariedade da leitura praticada na sociedade brasileira. Mas, como quem tem caneta de assinar cheques e de encaminhar leis tem o poder de veto, ao invés de refletir e discutir, a autoridade veta . E veta porque, no melhor dos casos e muitas vezes com a melhor das intenções, estende suas reações a certos livros a um numeroso e anônimo universo de leitores . .
No caso deste veto a “Caçadas de Pedrinho”, a Conselheira Relatora Nilma Lino Gomes acolhe denúncia de Antonio Gomes da Costa Neto que entende como manifestação de preconceito e intolerância “de maneira mais específica a personagem feminina e negra Tia Anastácia e as referências aos personagens animais tais como urubu, macaco e feras africanas; (...) aponta menção revestida de estereotipia ao negro e ao universo africano, que se repete em vários trechos do livro analisado” e exige “da editora responsável pela publicação a inserção no texto de apresentação de uma nota explicativa e de esclarecimentos ao leitor sobre os estudos atuais e críticos que discutam a presença de estereótipos na literatura.”
Independentemente do imenso equívoco em que, de meu ponto de vista, incorrem o denunciante e o CNE que aprova por unanimidade o parecer da relatora, o episódio torna-se assustador pelo que endossa, anuncia e recomenda de patrulhamento da leitura na escola brasileira. A nota exigida transforma livros em produtos de botica, que devem circular acompanhados de bula com instruções de uso.
O que a nota exigida deve explicar? O que significa esclarecer ao leitor sobre os estudos atuais e críticos que discutam a presença de estereótipos na literatura? A quem deve a editora encomendar a nota explicativa ? Qual seria o conteúdo da nota solicitada? A nota deve fazer uma auto-crítica (autoral, editorial?), assumindo que o livro contém estereótipos? A nota deve informar ao leitor que “Caçadas de Pedrinho” é um livro racista? Quem decidirá se a nota explicativa cumpre efetivamente o esclarecimento exigido pelo MEC?
As questões poderiam se multiplicar. Mas não vale a pena. O panorama que a multiplicação das questões delineia é por demais sinistro . Como fecho destas melancólicas maltraçadas aponte-se que qualquer nota no sentido solicitado – independente da denominação que venha a receber, do estilo em que seja redigida, e da autoria que assumir- será um desastre. Dará sinal verde para uma literatura autoritariamente auto-amordaçada. E este modelito da mordaça de agora talvez seja mais pernicioso do que a ostensiva queima de livros em praça pública, número medonho mas que de vez em quando entra em cartaz na história desta nossa Pátria amada idolatrada salve salve. E salve-se quem puder ... pois desta vez a censura não quer determinar apenas o que se pode ou não se pode ler, mas é mais sutil, determinando como se deve ler o que se lê! "
________________________________________
[1] Prof. Titular (aposentada) da UNICAMP; Prof. da Universidade Presbiteriana Mackenzie; Pequisadora Senior do CNPq.; Ex Secretária de Educação de Atibaia (SP); Organizadora ( com João Luís Ceccantini) do livro de Monteiro Lobato livro a livro (obra infantil) , obra que recebeu o Prêmio Jabuti 2009 como melhor livro de Não Ficção.
"Quem paga a música escolhe a dança?
Marisa Lajolo [1]
“Caçadas de Pedrinho”, de Monteiro Lobato, está em pauta e é bom que esteja, pois é um livro maravilhoso .
Narra as aventuras da turma do sítio de Dona Benta primeiro às voltas com a bicharada da floresta próxima e, depois, com uma comissão do governo encarregada de caçar um rinoceronte fugido de um circo. Nos dois episódios prevalecem o respeito ao leitor, a visão crítica da realidade, o humor fino e inteligente.
Na primeira narrativa, a da caçada da onça, as armas das crianças são improvisadas e na hora agá não funcionam. É apenas graças à esperteza e inventividade dos meninos que eles conseguem matar a onça e arrastá-la até a casa do sítio. A morte da onça provoca revolta nos bichos da floresta e eles planejam vingança numa assembléia muito divertida: felinos ferozes invadem o sítio e –de novo- é apenas graças à inventividade e esperteza das crianças ( particularmente de Emília) que as pessoas escapam de virar comida de onça.
Na segunda narrativa, a fuga de um rinoceronte de um circo e seu refúgio no sítio de dona Benta leva para lá a Comissão que o governo encarregou de lidar com a questão. Os moradores do sítio desmascaram a corrupção e o corpo mole da comissão, aliam-se ao animal cioso da liberdade conquistada e espantam seus proprietários. E, batizado Quindim, o rinoceronte fica para sempre incorporado às aventuras dos picapauzinhos.
Estas histórias constituem o enredo do livro que parecer recente do Conselho Nacional de Educação (CNE), a partir de denúncia recebida, quer proibir de integrar acervos com os quais programas governamentais compram livros para bibliotecas escolares. O CNE acredita que o livro veicula conteúdo racista e preconceituoso e que os professores não têm competência para lidar com tais questões. Os argumentos que fundamentam as acusações de racismo e preconceito são expressões pelas quais Tia Nastácia é referida no livro, bem como a menção à África como lugar de origem de animais ferozes.
Sabe-se hoje que diferentes leitores interpretam um mesmo texto de maneiras diferentes. Uns podem morrer de medo de uma cena que outros acham engraçada. Alguns podem sentir-se profundamente tocados por passagens que deixam outros impassíveis. Para ficar num exemplo brasileiro já clássico, uns acham que Capitu ( D. Casmurro, Machado de Assis, 1900) traiu mesmo o marido, e outros acham que não traiu, que o adultério foi fruto da mente de Bentinho. Outros ainda acham que Bentinho é que namorou Escobar .. !
É um grande avanço nos estudos literários esta noção mais aberta do que se passa na cabeça do leitor quando seus olhos estão num livro. Ela se fundamenta no pressuposto segundo o qual, dependendo da vida que teve e que tem, daquilo em que acredita ou desacredita, da situação na qual lê o que lê, cada um entende uma história de um jeito. Mas essa liberdade do leitor vive sofrendo atropelamentos. De vez em quando, educadores de todas as instâncias – da sala de aula ao Ministério de Educação- manifestam desconfiança da capacidade de os leitores se posicionarem de forma correta face ao que lêem .
Infelizmente, estamos vivendo um desses momentos.
Como os antigos diziam que quem paga a música escolhe a dança, talvez se acredite hoje ser correto que quem paga o livro escolha a leitura que dele se vai fazer. A situação atual tem sua (triste) caricatura no lobo de Chapeuzinho Vermelho que não é mais abatido pelos caçadores, e pela dona Chica-ca que não mais atira um pau no gato-to. Muda-se o final da história e re-escreve-se a letra da música porque se acredita que leitores e ouvintes sairão dos livros e das canções abatendo lobos e caindo de pau em bichanos . Trata-se de uma idéia pobre, precária e incorreta que além de considerar as crianças como tontas, desconsidera a função simbólica da cultura. Para ficar em um exemplo clássico, a psicanálise e os estudos literários ensinam que a madrasta malvada de contos de fada não desenvolve hostilidade contra a nova mulher do papai, mas – ao contrário- pode ajudar a criança a não se sentir muito culpada nos momentos em que odeia a mamãe, verdadeira ou adotiva...
Não deixa de ser curioso notar que esta pasteurização pretendida para os livros infantis e juvenis coincide com o lamento geral – de novo, da sala de aula ao Ministério da Educação—pela precariedade da leitura praticada na sociedade brasileira. Mas, como quem tem caneta de assinar cheques e de encaminhar leis tem o poder de veto, ao invés de refletir e discutir, a autoridade veta . E veta porque, no melhor dos casos e muitas vezes com a melhor das intenções, estende suas reações a certos livros a um numeroso e anônimo universo de leitores . .
No caso deste veto a “Caçadas de Pedrinho”, a Conselheira Relatora Nilma Lino Gomes acolhe denúncia de Antonio Gomes da Costa Neto que entende como manifestação de preconceito e intolerância “de maneira mais específica a personagem feminina e negra Tia Anastácia e as referências aos personagens animais tais como urubu, macaco e feras africanas; (...) aponta menção revestida de estereotipia ao negro e ao universo africano, que se repete em vários trechos do livro analisado” e exige “da editora responsável pela publicação a inserção no texto de apresentação de uma nota explicativa e de esclarecimentos ao leitor sobre os estudos atuais e críticos que discutam a presença de estereótipos na literatura.”
Independentemente do imenso equívoco em que, de meu ponto de vista, incorrem o denunciante e o CNE que aprova por unanimidade o parecer da relatora, o episódio torna-se assustador pelo que endossa, anuncia e recomenda de patrulhamento da leitura na escola brasileira. A nota exigida transforma livros em produtos de botica, que devem circular acompanhados de bula com instruções de uso.
O que a nota exigida deve explicar? O que significa esclarecer ao leitor sobre os estudos atuais e críticos que discutam a presença de estereótipos na literatura? A quem deve a editora encomendar a nota explicativa ? Qual seria o conteúdo da nota solicitada? A nota deve fazer uma auto-crítica (autoral, editorial?), assumindo que o livro contém estereótipos? A nota deve informar ao leitor que “Caçadas de Pedrinho” é um livro racista? Quem decidirá se a nota explicativa cumpre efetivamente o esclarecimento exigido pelo MEC?
As questões poderiam se multiplicar. Mas não vale a pena. O panorama que a multiplicação das questões delineia é por demais sinistro . Como fecho destas melancólicas maltraçadas aponte-se que qualquer nota no sentido solicitado – independente da denominação que venha a receber, do estilo em que seja redigida, e da autoria que assumir- será um desastre. Dará sinal verde para uma literatura autoritariamente auto-amordaçada. E este modelito da mordaça de agora talvez seja mais pernicioso do que a ostensiva queima de livros em praça pública, número medonho mas que de vez em quando entra em cartaz na história desta nossa Pátria amada idolatrada salve salve. E salve-se quem puder ... pois desta vez a censura não quer determinar apenas o que se pode ou não se pode ler, mas é mais sutil, determinando como se deve ler o que se lê! "
________________________________________
[1] Prof. Titular (aposentada) da UNICAMP; Prof. da Universidade Presbiteriana Mackenzie; Pequisadora Senior do CNPq.; Ex Secretária de Educação de Atibaia (SP); Organizadora ( com João Luís Ceccantini) do livro de Monteiro Lobato livro a livro (obra infantil) , obra que recebeu o Prêmio Jabuti 2009 como melhor livro de Não Ficção.
sábado, 30 de outubro de 2010
Henrique VIII e Thomas Morus
Retomo o tema da postagem anterior.
Gostaria que Silvio Pellico tivesse exposto em sua tragédia as razões de Henrique VIII, pois toda a peça é uma defesa de Morus - embora não se entre no mérito dos argumentos que Morus levantava contra o rei: em toda a peça, tudo o que ele diz é que queria ser fiel à religião dos seus pais.
Henrique VIII, aconselhado por seu pai, casou-se com a viúva de seu irmão, Catarina de Espanha, porque o velho monarca achava vantajoso manter a aliança com a pátria de Cervantes. Quer dizer, ser rei significa não ter direito ao amor. Verdi diz isso numa das árias de "O Baile de Máscaras".
Quando surge a Reforma Protestante, Henrique VIII fez bonito e ganhou prestígio no Vaticano: escreveu um livro chamado "Em Defesa dos Sete Sacramentos". O papa Júlio II gostou tanto que lhe deu o título de "Guardião da Fé" que hoje, Sua Majestade Britânica, Elisabeth II, chefe da Igreja Anglicana, ostenta com orgulho. Júlio II nunca esperaria uma traição justo da parte de Henrique VIII. Acho que aquela pintura de Michelangelo chamada "A Conversão de São Paulo", na Capela Paulina, que mostra Paulo de Tarso caindo do cavalo, é uma referência a isso, pois o apóstolo é a cara do Pontífice. (Será que se eu escrevesse um livro chamado "O Código Michelangelo", expondo minhas interpretações heréticas da obra do florentino, eu ganharia tanto dinheiro quanto o Dan Brown com "O Código Da Vinci"?)
Mas todo rei tem certas obrigações. Procriar é uma delas para que o trono tenha herdeiros e não caia nas mãos de uma nobreza estrangeira, como aconteceu com o trono português,do qual os parentes espanhóis de D. Sebastião se apoderaram quando ele e seu tio cardeal morreram ambos sem filhos. (Custava o cardeal dar uma furunfadinha pelo bem da pátria? Quebrava o voto de castidade por algumas noites mas salvava a pátria e poderia se reabilitar depois. Quem sabe conversando ele não se entendia com o Vaticano? Talvez se o Viagra já tivesse sido inventado...) Chega então um momento em que a rainha Catarina, após várias gestações fracassadas, atinge a menopausa, e o rei, cheio de disposição, encontra as meninas da família Bolena. O homem tinha que fazer valer o seu cetro, não era não?
Dizem os alemães que uma tragédia é um conflito em que os dois lados estão certos. Sim, o rei fez um juramento de que ia ser fiel à esposa até que a morte os separasse. Sim, esperava-se que o rei desse exemplo de conduta cristã para os súditos. Sim, um rei tem que preservar as instituições. Mas para preservar a instituição da monarquia, a independência da Pátria, ele tem que procriar, e a rainha não servia mais para essa função. E Anna Bolena prestou-se muito bem a essa tarefa.
Mas o papa não queria entender. Que outra opção ele tinha senão romper com Roma e fundar sua própria igreja? Tanto pior pro papa, pois Henrique aproveitou para se apoderar das riquezas da Igreja Católica e seus templos. Bom pros padres que, infiés ao papa, puderam casar ou regularizar suas relações com suas amantes. Ruim para os fiéis que pagaram com o sangue a infidelidade.
Com sangue e esperma escreveu-se a história da Igreja Anglicana. Está aí uma tragédia para ser escrita.
Ah, Saramago, que falta nos fazes...
Gostaria que Silvio Pellico tivesse exposto em sua tragédia as razões de Henrique VIII, pois toda a peça é uma defesa de Morus - embora não se entre no mérito dos argumentos que Morus levantava contra o rei: em toda a peça, tudo o que ele diz é que queria ser fiel à religião dos seus pais.
Henrique VIII, aconselhado por seu pai, casou-se com a viúva de seu irmão, Catarina de Espanha, porque o velho monarca achava vantajoso manter a aliança com a pátria de Cervantes. Quer dizer, ser rei significa não ter direito ao amor. Verdi diz isso numa das árias de "O Baile de Máscaras".
Quando surge a Reforma Protestante, Henrique VIII fez bonito e ganhou prestígio no Vaticano: escreveu um livro chamado "Em Defesa dos Sete Sacramentos". O papa Júlio II gostou tanto que lhe deu o título de "Guardião da Fé" que hoje, Sua Majestade Britânica, Elisabeth II, chefe da Igreja Anglicana, ostenta com orgulho. Júlio II nunca esperaria uma traição justo da parte de Henrique VIII. Acho que aquela pintura de Michelangelo chamada "A Conversão de São Paulo", na Capela Paulina, que mostra Paulo de Tarso caindo do cavalo, é uma referência a isso, pois o apóstolo é a cara do Pontífice. (Será que se eu escrevesse um livro chamado "O Código Michelangelo", expondo minhas interpretações heréticas da obra do florentino, eu ganharia tanto dinheiro quanto o Dan Brown com "O Código Da Vinci"?)
Mas todo rei tem certas obrigações. Procriar é uma delas para que o trono tenha herdeiros e não caia nas mãos de uma nobreza estrangeira, como aconteceu com o trono português,do qual os parentes espanhóis de D. Sebastião se apoderaram quando ele e seu tio cardeal morreram ambos sem filhos. (Custava o cardeal dar uma furunfadinha pelo bem da pátria? Quebrava o voto de castidade por algumas noites mas salvava a pátria e poderia se reabilitar depois. Quem sabe conversando ele não se entendia com o Vaticano? Talvez se o Viagra já tivesse sido inventado...) Chega então um momento em que a rainha Catarina, após várias gestações fracassadas, atinge a menopausa, e o rei, cheio de disposição, encontra as meninas da família Bolena. O homem tinha que fazer valer o seu cetro, não era não?
Dizem os alemães que uma tragédia é um conflito em que os dois lados estão certos. Sim, o rei fez um juramento de que ia ser fiel à esposa até que a morte os separasse. Sim, esperava-se que o rei desse exemplo de conduta cristã para os súditos. Sim, um rei tem que preservar as instituições. Mas para preservar a instituição da monarquia, a independência da Pátria, ele tem que procriar, e a rainha não servia mais para essa função. E Anna Bolena prestou-se muito bem a essa tarefa.
Mas o papa não queria entender. Que outra opção ele tinha senão romper com Roma e fundar sua própria igreja? Tanto pior pro papa, pois Henrique aproveitou para se apoderar das riquezas da Igreja Católica e seus templos. Bom pros padres que, infiés ao papa, puderam casar ou regularizar suas relações com suas amantes. Ruim para os fiéis que pagaram com o sangue a infidelidade.
Com sangue e esperma escreveu-se a história da Igreja Anglicana. Está aí uma tragédia para ser escrita.
Ah, Saramago, que falta nos fazes...
Thomas Morus
Sou apaixonado por palavras. Gosto de ler um bom texto. Não importa a sua ideologia. Gosto de produzir bons textos e quando traduzo nem sempre concordo com tudo quanto traduzo. Mas traduzir um bom texto é um enorme prazer e me sinto amigo dos autores a quem traduzo, e não concordamos com tudo que nossos amigos dizem ou pensam.
Dia 29 de outubro estive na SBAT (Sociedade Brasileira de Autores Teatrais) para arquivar a tradução que fiz da peça "Thomas Morus", de Silvio Pellico (1789 - 1954).
A peça é comovente. Trata dos últimos dias de Thomas Morus, o filósofo autor de "A Utopia", que foi decapitado por não transigir com suas convicções católicas quando Henrique VIII fundou a Igreja Anglicana. Por isso, João Paulo II, em seus últimos dias, proclamou santo protetor dos políticos. Bem, a memória do papa não andava muito boa, pois, em "A Utopia", Morus defende algumas ideias que o Vaticano condena, como a eutanásia...
Falar de religião é falar de sangue, de matança, pois a História das Religiões é a História da Intolerância e da Carnificina. Jorge Amado disse que as terras do sul da Bahia, onde se plantava cacau, são fertilíssimas porque adubadas com sangue humano, adubo sem igual. Se esse adubo for tão eficiente assim, ainda mais férteis são as terras europeias, tal a quantidade de sangue que católicos e protestantes derramaram por lá.
É claro que eu preferiria uma tragédia que não tomasse partido nem pelos católicos nem pelos protestantes, que são Montechios e Capuletos com discursos teológicos; uma tragédia como "In Nomine Dei" de Saramago. Mas embora o texto de Silvio Pellico seja explicitamente católico, não deixa de comover o carinho extremado de Margaret por seu pai (várias vezes os dois personagens me fizeram chorar enquanto traduzia) e é admirável a coragem de Morus que, por três vezes, recusa a liberdade que lhe é oferecida. E num momento em que o fanatismo religioso ganha cada vez mais espaço no Parlamento brasileiro, todos os textos que lembrem o quanto de sangue que já se derramou em nome de Deus para derrotar o Diabo (que, se existisse, processaria todas as igrejas por calúnia e difamação) merecem ser lidos e representados.
Dia 29 de outubro estive na SBAT (Sociedade Brasileira de Autores Teatrais) para arquivar a tradução que fiz da peça "Thomas Morus", de Silvio Pellico (1789 - 1954).
A peça é comovente. Trata dos últimos dias de Thomas Morus, o filósofo autor de "A Utopia", que foi decapitado por não transigir com suas convicções católicas quando Henrique VIII fundou a Igreja Anglicana. Por isso, João Paulo II, em seus últimos dias, proclamou santo protetor dos políticos. Bem, a memória do papa não andava muito boa, pois, em "A Utopia", Morus defende algumas ideias que o Vaticano condena, como a eutanásia...
Falar de religião é falar de sangue, de matança, pois a História das Religiões é a História da Intolerância e da Carnificina. Jorge Amado disse que as terras do sul da Bahia, onde se plantava cacau, são fertilíssimas porque adubadas com sangue humano, adubo sem igual. Se esse adubo for tão eficiente assim, ainda mais férteis são as terras europeias, tal a quantidade de sangue que católicos e protestantes derramaram por lá.
É claro que eu preferiria uma tragédia que não tomasse partido nem pelos católicos nem pelos protestantes, que são Montechios e Capuletos com discursos teológicos; uma tragédia como "In Nomine Dei" de Saramago. Mas embora o texto de Silvio Pellico seja explicitamente católico, não deixa de comover o carinho extremado de Margaret por seu pai (várias vezes os dois personagens me fizeram chorar enquanto traduzia) e é admirável a coragem de Morus que, por três vezes, recusa a liberdade que lhe é oferecida. E num momento em que o fanatismo religioso ganha cada vez mais espaço no Parlamento brasileiro, todos os textos que lembrem o quanto de sangue que já se derramou em nome de Deus para derrotar o Diabo (que, se existisse, processaria todas as igrejas por calúnia e difamação) merecem ser lidos e representados.
domingo, 3 de outubro de 2010
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
12 PERGUNTAS PARA O PASTOR MALAFAIA
12 PERGUNTAS PARA O PASTOR MALAFAIA
Pastor Silas Malafaia,
Em setembro de 2010, nas vésperas das eleições, o sr. espalhou pelo Brasil outdoors com as palavras “Em defesa da família e da preservação da espécie humana. Deus criou macho e fêmea”. Sua intenção era impedir que os eleitores votassem em candidatos que apoiassem os direitos dos homossexuais e a criminalização da homofobia. Se o senhor tem medo de que a espécie humana deixe de existir por causa dos homossexuais e acha que gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais são uma ameaça ao nosso país, gostaria de lhe fazer algumas perguntas:
1) O senhor conhece algum país que não tenha homossexuais?
2) O senhor conhece algum país que não tenha heterossexuais?
3) O senhor conhece um país onde não nasça mais ninguém por causa dos homossexuais?
4) Em que artigo da Constituição brasileira está a palavra “pecado”?
5) O senhor é a favor da República e do Estado laico ou acha que a religião tem que fazer parte do governo, como na época do Brasil colônia, quando a Inquisição prendia quem não fosse católico?
6) O senhor acha que deveria haver uma Inquisição para prender quem não vivesse de acordo com as ideias que o senhor defende?
7) Dinamarca, Portugal e Argentina reconheceram as uniões homossexuais. Alguém já foi preso em um desses países por dizer que a homossexualidade é pecado?
8) Pelo menos um homossexual é assassinado a cada dois dias no Brasil. Se as pessoas correm risco de serem assassinadas só por serem homossexuais e são humilhadas diariamente com piadinhas, deboches e outros tipos de constrangimentos, por que elas não se tornam heteros se é questão de escolha?
9) Por que certas pessoas no Irã continuam sendo homossexuais se sabem que podem ser condenadas à morte por causa disso?
10) Por que certos alemães não deixaram de ser homossexuais apesar de Hitler ter tentado matar todos eles nos campos de concentração?
11) Não é mais fácil ser heterossexual?
12) A Organização Mundial da Saúde diz que não há nada errado em ser homossexual. O senhor entende tanto assim de Medicina a ponto de por em dúvida o que diz a Organização Mundial da Saúde?
Pastor Silas Malafaia,
Em setembro de 2010, nas vésperas das eleições, o sr. espalhou pelo Brasil outdoors com as palavras “Em defesa da família e da preservação da espécie humana. Deus criou macho e fêmea”. Sua intenção era impedir que os eleitores votassem em candidatos que apoiassem os direitos dos homossexuais e a criminalização da homofobia. Se o senhor tem medo de que a espécie humana deixe de existir por causa dos homossexuais e acha que gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais são uma ameaça ao nosso país, gostaria de lhe fazer algumas perguntas:
1) O senhor conhece algum país que não tenha homossexuais?
2) O senhor conhece algum país que não tenha heterossexuais?
3) O senhor conhece um país onde não nasça mais ninguém por causa dos homossexuais?
4) Em que artigo da Constituição brasileira está a palavra “pecado”?
5) O senhor é a favor da República e do Estado laico ou acha que a religião tem que fazer parte do governo, como na época do Brasil colônia, quando a Inquisição prendia quem não fosse católico?
6) O senhor acha que deveria haver uma Inquisição para prender quem não vivesse de acordo com as ideias que o senhor defende?
7) Dinamarca, Portugal e Argentina reconheceram as uniões homossexuais. Alguém já foi preso em um desses países por dizer que a homossexualidade é pecado?
8) Pelo menos um homossexual é assassinado a cada dois dias no Brasil. Se as pessoas correm risco de serem assassinadas só por serem homossexuais e são humilhadas diariamente com piadinhas, deboches e outros tipos de constrangimentos, por que elas não se tornam heteros se é questão de escolha?
9) Por que certas pessoas no Irã continuam sendo homossexuais se sabem que podem ser condenadas à morte por causa disso?
10) Por que certos alemães não deixaram de ser homossexuais apesar de Hitler ter tentado matar todos eles nos campos de concentração?
11) Não é mais fácil ser heterossexual?
12) A Organização Mundial da Saúde diz que não há nada errado em ser homossexual. O senhor entende tanto assim de Medicina a ponto de por em dúvida o que diz a Organização Mundial da Saúde?
Veste a carapuça, Malafaia!
Apesar de um estudo do Grupo Gay da Bahia apontar que a cada dois dias um homossexual é assassinado no Brasil, o pastor Silas Malafaia acha que é paranoia quando nós falamos em homofobia. Ele próprio é um exemplo disso quando espalha pelas nossas cidades outdoors falando em defesa da "preservação da espécie humana". Ora, sr. Malafaia, os homossexuais não ameaçam a espécie humana, pois qualquer pessoa que tenha lido algo mais além de revistas em quadrinhos sabe que em todos os lugares e em todas as épocas pessoas mantiveram relações AMOROSAS homossexuais e a humanidade continuou existindo, pois os homossexuais sempre foram e serão minoria. Uma minoria que tem o direito de viver e não quer continuar sendo caçada simplesmente por AMAR diferente. E quer ter os mesmos direitos dos casais heteros (adoção, comunhão de bens, herança etc.). Mais: o Estado é laico e por isso deve visar o bem comum, ao invés de impor à totalidade da população os preceitos de qualquer religião. E caso o senhor alguma vez tenha lido a Constituição, lá não existe a a palavra "pecado".
domingo, 19 de setembro de 2010
CRIVELLA E A JUSTIÇA
No seu jornalzinho de campanha, Crivella se diz “o senador da família” e “o senador dos injustiçados”. Isso porque apresentou no Senado um projeto que “denomina convivente o estado civil constituído de união estável”. Meu caro senador, não importa se chamamos isso de “convivência” ou de concubinato, o fato é que, há muito tempo, quando um homem e uma mulher vivem juntos têm os mesmos direitos de quem se casou no cartório. Tudo o que Vossa Excelência fez foi arranjar um nome mais bonitinho. Mais importante seria se esses direitos dos casais heterossexuais fossem estendidos também aos casais homossexuais. Fica aí uma sugestão para depois das eleições.
Ele se diz também “o senador dos injustiçados”. Bem, segundo o Grupo Gay da Bahia, a cada dois dias um homossexual é morto em nosso país só por ser homossexual. Nem no Irã morrem tantos homossexuais! Aqui mesmo em São Gonçalo, o adolescente Alexandre Ivo Rajão foi morto só por causa disso. E o PLC 122, que transforma a homofobia em crime igual ao do racismo continua engavetado por parlamentares conservadores como Vossa Excelência. Que tal assumir que os gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais também são injustiçados e fazer alguma coisa em favor deles?
Professor Edson Amaro, do CIEP Miguel de Cervantes e do C. E. Trasilbo Filgueiras.
Ele se diz também “o senador dos injustiçados”. Bem, segundo o Grupo Gay da Bahia, a cada dois dias um homossexual é morto em nosso país só por ser homossexual. Nem no Irã morrem tantos homossexuais! Aqui mesmo em São Gonçalo, o adolescente Alexandre Ivo Rajão foi morto só por causa disso. E o PLC 122, que transforma a homofobia em crime igual ao do racismo continua engavetado por parlamentares conservadores como Vossa Excelência. Que tal assumir que os gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais também são injustiçados e fazer alguma coisa em favor deles?
Professor Edson Amaro, do CIEP Miguel de Cervantes e do C. E. Trasilbo Filgueiras.
CRIVELLA E A ECOLOGIA
No seu jornalzinho de campanha, Crivella se declara “o senador dos ecoamigos”. Diz que apresentou projeto que “inclui o cerrado, a caatinga, a mata de cocais e os campos sulinos no rol dos biomas brasileiros considerados patrimônios nacionais”. Suas intenções são as melhores, senador, mas de boas intenções o inferno está cheio (talvez Vossa Excelência tenha estudado o tema em Teologia). O cerrado está sendo devastado pelo cultivo da soja para exportação, os campos sulinos, bem como os recursos hídricos do Rio Grande do Sul, estão sendo devastados pela plantação de eucalipto para exportação – tudo isso em nome de trazer divisas para o país: esse é o credo do agronegócio – em prejuízo do meio ambiente e dos pequenos agricultores. E o que o senhor tem feito pela reforma agrária? Posso perguntar ao MST?
Outro dos seus projetos “autoriza o Governo Federal a criar a Agência Nacional de Energias Renováveis”. Então o Governo está autorizado, se tiver vontade de investir em energias renováveis. Não é o que parece, se olharmos os bilhões gastos com a construção da Usina de Belo monte, que alagará um território imenso da Amazônia e expulsará os índios de uma terra que eles consideram santa. Enquanto isso, a Alemanha, país gélido e muito pouco ensolarado, aproveita muito melhor que nosso país tropical, abençoado por Deus, a limpíssima energia solar. Ah, sim, outro projeto “fomenta o uso de energia solar em edificações públicas e privadas, para aquecimento de água”. É por isso que todas as escolas do país e hospitais do país têm agora painéis solares no teto, como todos nós vemos todos os dias, não vemos?
Outro projeto “obriga a veiculação de advertência sobre consumo e escassez de água”. Viram isso nos intervalos comerciais? Então é uma lei para ingleses e eleitores verem na letra miúda da propaganda eleitoral?
Senador, os seus talentos serão melhor aproveitados se Vossa Excelência voltar para a fazenda Canaã para contar às criancinhas da creche a história da Arca de Noé.
Professor Edson Amaro, do CIEP Miguel de Cervantes e do C. E. Trasilbo Filgueiras.
Outro dos seus projetos “autoriza o Governo Federal a criar a Agência Nacional de Energias Renováveis”. Então o Governo está autorizado, se tiver vontade de investir em energias renováveis. Não é o que parece, se olharmos os bilhões gastos com a construção da Usina de Belo monte, que alagará um território imenso da Amazônia e expulsará os índios de uma terra que eles consideram santa. Enquanto isso, a Alemanha, país gélido e muito pouco ensolarado, aproveita muito melhor que nosso país tropical, abençoado por Deus, a limpíssima energia solar. Ah, sim, outro projeto “fomenta o uso de energia solar em edificações públicas e privadas, para aquecimento de água”. É por isso que todas as escolas do país e hospitais do país têm agora painéis solares no teto, como todos nós vemos todos os dias, não vemos?
Outro projeto “obriga a veiculação de advertência sobre consumo e escassez de água”. Viram isso nos intervalos comerciais? Então é uma lei para ingleses e eleitores verem na letra miúda da propaganda eleitoral?
Senador, os seus talentos serão melhor aproveitados se Vossa Excelência voltar para a fazenda Canaã para contar às criancinhas da creche a história da Arca de Noé.
Professor Edson Amaro, do CIEP Miguel de Cervantes e do C. E. Trasilbo Filgueiras.
CRIVELLA E OS NORDESTINOS
É incrível como o senador Crivella explora o analfabetismo político de nossa gente para se promover. No seu jornalzinho de campanha, na primeira página, há a manchete: “Fazenda Canaã: a reforma agrária bem-sucedida”. Se o PROCOM interviesse em assuntos políticos, valia processá-lo por propaganda enganosa. Reforma agrária é distribuir terras, limitar por lei o tamanho das propriedades e apoiar os pequenos agricultores. Qualquer militante do MST sabe disso. Quem quiser saber mais, confira: www.mst.org.br. A fazenda Canaã é propriedade privada do senador, sendo assim, ele não dividiu terras com ninguém. E nenhum cidadão pode fazer reforma agrária sozinho. Isso cabe só ao governo.
E na qualidade de nordestino orgulhoso de suas raízes, que chora ouvindo as canções de Luís Gonzaga que tratam da catástrofe da seca, eu ouço o blá-blá-blá do Crivella sobre sua fazendinha irrigada e me pergunto: e eu com isso? Ele fez o que fez com o dinheiro dele numa propriedade que pertence a ele, mas eu, toda vez que compro alguma coisa pago impostos e o dinheiro desses impostos deveria servir para auxiliar as populações do semi-árido a conviverem com a seca, financiando obras úteis à região e ensinando ao povo técnicas de cultivo aptas a resistirem à seca. E quando foi que o senador Crivella perguntou no Senado para onde tem ido o dinheiro que o governo destinou todos esses anos para enfrentar a seca? Quando foi que ele citou “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, no Senado, livro no qual o jornalista fluminense já estudava o problema e propunha soluções em 1902?
De fato, o falecido Euclides da Cunha tem feito mais pelo Nordeste que o vivíssimo Crivella.
Professor Edson Amaro, do CIEP Miguel de Cervantes e do C. E. Trasilbo Filgueiras.
E na qualidade de nordestino orgulhoso de suas raízes, que chora ouvindo as canções de Luís Gonzaga que tratam da catástrofe da seca, eu ouço o blá-blá-blá do Crivella sobre sua fazendinha irrigada e me pergunto: e eu com isso? Ele fez o que fez com o dinheiro dele numa propriedade que pertence a ele, mas eu, toda vez que compro alguma coisa pago impostos e o dinheiro desses impostos deveria servir para auxiliar as populações do semi-árido a conviverem com a seca, financiando obras úteis à região e ensinando ao povo técnicas de cultivo aptas a resistirem à seca. E quando foi que o senador Crivella perguntou no Senado para onde tem ido o dinheiro que o governo destinou todos esses anos para enfrentar a seca? Quando foi que ele citou “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, no Senado, livro no qual o jornalista fluminense já estudava o problema e propunha soluções em 1902?
De fato, o falecido Euclides da Cunha tem feito mais pelo Nordeste que o vivíssimo Crivella.
Professor Edson Amaro, do CIEP Miguel de Cervantes e do C. E. Trasilbo Filgueiras.
quarta-feira, 15 de setembro de 2010
sexta-feira, 10 de setembro de 2010
A farra dos livros
Só agora, aos 33 anos, estou lendo “A Origem das Espécies”, um dos livros mais importantes de nossa civilização e estou me deliciando com o estilo de Darwin, elegante e acessível ao leitor mediano, repleto de questionamentos sobre a antiga Biologia, calcada no mito da Criação e no fixismo da natureza. Lá pelo terceiro capítulo comecei a pensar: por que não entregar um exemplar dessa obra a cada estudante do país?
As razões são duas: uma para não irritar as igrejas que, na encolha, reconhecem os méritos desse homem que mudou todo o pensamento científico, mas que, à luz do sol, continuam contando aos fiéis a velha fábula do Éden como se fosse fato histórico e não a fábula que é. Isso porque estão comprometidas com a manutenção de tudo o que é velho; porque vendem a mentira da eternidade das instituições, embora, dentro de seus próprios templos, não haja mais espaço para a eternidade, como havia naquelas magníficas catedrais medievais que levavam séculos para ficarem prontas e abrigavam em seu interior os túmulos dos ilustres, a espera da ressurreição que nunca vem; porque dar aos fiéis a liberdade de questionar uma única página da Bíblia seria abrir caminho para que o livro todo fosse questionado e então, o que seria dos curas e de suas sinecuras?
A outra razão é que o capitalismo, embora se diga eterno, é inimigo de tudo o que é perene. Vivemos a civilização do descartável, a arte celebra “a maior banda de todos os tempos da última semana” e a ambição maior da indústria automobilística é inventar o carro de papel, para que seja trocado a cada chuva.
Por isso, a cada três anos, nós, professores, somos convocados a eleger os novos livros didáticos de cada matéria e são permitidas às editoras coisas que não se permitem aos candidatos aos poderes Executivo e Legislativo. E, como a cada ano, elegem-se os livros de uma ou duas matérias, todos os anos cataratas de dinheiro público são gastos em livros descartáveis, que pouco ou nada contribuem para apresentar aos nossos jovens as grandes realizações da Arte, da Ciência e da Filosofia.
Acho que, ao invés de tantos livros efêmeros, seria melhor entregar aos jovens obras duradouras em domínio público: no último ano do Ensino Fundamental ou no primeiro do Ensino Médio, entregar-lhes uma boa tradução de “A Origem das Espécies” e mais nada para o estudo da Biologia nesse ano; ninguém deveria concluir o 9º ano sem conhecer ao menos um Sermão do Padre Vieira, um romance de José de Alencar e outro de Machado de Assis; ninguém deveria ingressar na Universidade sem ter lido “Os Lusíadas” inteiro; por que terminar o Ensino Fundamental sem ler “Declínio e Queda do Império Romano”, de Gibbon, no curso de História e “A República”, de Platão e os “Ensaios”, de Montaigne e “O Contrato Social”, de Rousseau nas aulas de Filosofia ou Sociologia? Para que os alunos se sentissem seguros de conhecer uma língua estrangeira, que se lhes entregasse um romance de Jane Austen onde se lecionasse Inglês, um de Alexandre Dumas ou de Flaubert onde se optasse pelo Francês, as “Novelas Exemplares”, de Cervantes no caso do Espanhola ou mesmo as peças de García Lorca.
Caramba! Falei o nome de Lorca. Vão achar que eu sou comunista. E sou mesmo. Só mesmo um comunista para desejar tanta leitura séria num país em que a escola pública forma analfabetos funcionais. E a privada? Será que estimula o pensamento crítico?
As razões são duas: uma para não irritar as igrejas que, na encolha, reconhecem os méritos desse homem que mudou todo o pensamento científico, mas que, à luz do sol, continuam contando aos fiéis a velha fábula do Éden como se fosse fato histórico e não a fábula que é. Isso porque estão comprometidas com a manutenção de tudo o que é velho; porque vendem a mentira da eternidade das instituições, embora, dentro de seus próprios templos, não haja mais espaço para a eternidade, como havia naquelas magníficas catedrais medievais que levavam séculos para ficarem prontas e abrigavam em seu interior os túmulos dos ilustres, a espera da ressurreição que nunca vem; porque dar aos fiéis a liberdade de questionar uma única página da Bíblia seria abrir caminho para que o livro todo fosse questionado e então, o que seria dos curas e de suas sinecuras?
A outra razão é que o capitalismo, embora se diga eterno, é inimigo de tudo o que é perene. Vivemos a civilização do descartável, a arte celebra “a maior banda de todos os tempos da última semana” e a ambição maior da indústria automobilística é inventar o carro de papel, para que seja trocado a cada chuva.
Por isso, a cada três anos, nós, professores, somos convocados a eleger os novos livros didáticos de cada matéria e são permitidas às editoras coisas que não se permitem aos candidatos aos poderes Executivo e Legislativo. E, como a cada ano, elegem-se os livros de uma ou duas matérias, todos os anos cataratas de dinheiro público são gastos em livros descartáveis, que pouco ou nada contribuem para apresentar aos nossos jovens as grandes realizações da Arte, da Ciência e da Filosofia.
Acho que, ao invés de tantos livros efêmeros, seria melhor entregar aos jovens obras duradouras em domínio público: no último ano do Ensino Fundamental ou no primeiro do Ensino Médio, entregar-lhes uma boa tradução de “A Origem das Espécies” e mais nada para o estudo da Biologia nesse ano; ninguém deveria concluir o 9º ano sem conhecer ao menos um Sermão do Padre Vieira, um romance de José de Alencar e outro de Machado de Assis; ninguém deveria ingressar na Universidade sem ter lido “Os Lusíadas” inteiro; por que terminar o Ensino Fundamental sem ler “Declínio e Queda do Império Romano”, de Gibbon, no curso de História e “A República”, de Platão e os “Ensaios”, de Montaigne e “O Contrato Social”, de Rousseau nas aulas de Filosofia ou Sociologia? Para que os alunos se sentissem seguros de conhecer uma língua estrangeira, que se lhes entregasse um romance de Jane Austen onde se lecionasse Inglês, um de Alexandre Dumas ou de Flaubert onde se optasse pelo Francês, as “Novelas Exemplares”, de Cervantes no caso do Espanhola ou mesmo as peças de García Lorca.
Caramba! Falei o nome de Lorca. Vão achar que eu sou comunista. E sou mesmo. Só mesmo um comunista para desejar tanta leitura séria num país em que a escola pública forma analfabetos funcionais. E a privada? Será que estimula o pensamento crítico?
domingo, 27 de junho de 2010
O Senado tem mãos sujas de sangue
Neste dia 27/06/2010, fizemos uma passeata em São Gonçalo, RJ, para protestar contra o sequestro, tortura e morte do adolescente Alexandre Ivo por skinheads que determinaram que ele era gay e, portanto, deveria morrer. Crimes assim se repetem todos os dias pelo Brasil. E os LGBTs não são condenados (sem processo ou julgamento) apenas à morte física, mas à morte social, ao achincalhe, ao linchamento, ao apedrejamento moral todos os dias, pois, como disse certo romancista italiano do séc. XIX cujo nome não recordo, "não é somente metendo uma faca no peito que se mata um homem".
O primeiro passo para se curar esse mal tem sido dado por militantes, ativistas, educadores, escritores, artistas, sindicalistas etc., gente da sociedade civil que combatem dia a dia a homofobia. Passo maior poderia ser dado pelo Parlamento, se aprovasse o PLC 122, que declara a homofobia crime inafiançável, tal como o racismo. A Câmara dos Deputados já deu seu parecer a favor, mas o Senado se faz esperar e os LGBTs ameaçados de morte todos os dias têm pressa.
O Senado tem as mãos sujas de sangue, por cada dia de espera, de protelação, por obra e graça de parlamentares fundamentalistas que, com a Bíblia nas mãos, dizem que "amam os homossexuais mas não a homossexualidade". Se algum negro está lendo este texto, gostaria de lhe perguntar o que acharia de alguém que dissesse "amo os negros mas não a negritude", como se ser negro fosse um defeito e estivesse em suas mãos deixar de ser negro e escapar do racismo que quer eliminá-lo. Da mesma forma, por que essas pessoas escolheriam ser LGBTs se pudessem optar pelo caminho mais fácil da heterossexualidade?
Dizem eles que defendem a família, mas que defesa é essa que contribui com o que desagrega as famílias? O ódio, o desprezo, o desrespeito aos LGBTs afasta pais de filhos, irmãos de irmãos, tios de sobrinhos, primos de primos, avós de netos, ergue um "apartheid" separando os galhos da árvore genealógica.
Mesmo assim, citarei as Escrituras para aqueles que fazem questão de lê-las. Quando Caim matou Abel e o Senhor lhe perguntou sobre seu irmão, ele respondeu covardemente: "Não sei: sou eu guardador do meu irmão?" (Gênesis 4: 9) Esta é a resposta de todos os assassinos que mentem a sua culpa. Sim, somos todos guardiãos de nossos irmãos. E, se nos calamos, se fechamos os ouvidos ao clamor do sangue que pede Justiça, nos tornamos cúmplices.
Edson Amaro, diretor do SEPE (Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação), núcleo São Gonçalo
O primeiro passo para se curar esse mal tem sido dado por militantes, ativistas, educadores, escritores, artistas, sindicalistas etc., gente da sociedade civil que combatem dia a dia a homofobia. Passo maior poderia ser dado pelo Parlamento, se aprovasse o PLC 122, que declara a homofobia crime inafiançável, tal como o racismo. A Câmara dos Deputados já deu seu parecer a favor, mas o Senado se faz esperar e os LGBTs ameaçados de morte todos os dias têm pressa.
O Senado tem as mãos sujas de sangue, por cada dia de espera, de protelação, por obra e graça de parlamentares fundamentalistas que, com a Bíblia nas mãos, dizem que "amam os homossexuais mas não a homossexualidade". Se algum negro está lendo este texto, gostaria de lhe perguntar o que acharia de alguém que dissesse "amo os negros mas não a negritude", como se ser negro fosse um defeito e estivesse em suas mãos deixar de ser negro e escapar do racismo que quer eliminá-lo. Da mesma forma, por que essas pessoas escolheriam ser LGBTs se pudessem optar pelo caminho mais fácil da heterossexualidade?
Dizem eles que defendem a família, mas que defesa é essa que contribui com o que desagrega as famílias? O ódio, o desprezo, o desrespeito aos LGBTs afasta pais de filhos, irmãos de irmãos, tios de sobrinhos, primos de primos, avós de netos, ergue um "apartheid" separando os galhos da árvore genealógica.
Mesmo assim, citarei as Escrituras para aqueles que fazem questão de lê-las. Quando Caim matou Abel e o Senhor lhe perguntou sobre seu irmão, ele respondeu covardemente: "Não sei: sou eu guardador do meu irmão?" (Gênesis 4: 9) Esta é a resposta de todos os assassinos que mentem a sua culpa. Sim, somos todos guardiãos de nossos irmãos. E, se nos calamos, se fechamos os ouvidos ao clamor do sangue que pede Justiça, nos tornamos cúmplices.
Edson Amaro, diretor do SEPE (Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação), núcleo São Gonçalo
domingo, 20 de junho de 2010
Bagunça na Educação estadual
O programa "Conexão Professor" é o novo elefante branco que o governo do estado inventou para justificar os milhões que gastou em tecnologia ao invés de pagar salários decentes aos educadores. E, até agora, muitos professores não registraram na Internet as notas dos alunos ou porque sabem que isso não é tarefa deles, por mais que o governo autoritariamente insista que sim, ou porque não conseguem, pois o programa é complicadamente ineficiente. Se houvesse um Prêmio Nobel para a incompetência, deveria ser dado à secretária de Educação Teresa Porto, que nem educadora é, mas analista de sistemas, ou seja, mais uma tecnocrata. Assino e me identifico como professor indignado da rede estadual.
Edson Amaro de Souza, professor do C. E. Trasilbo Filgueiras e do CIEP 415 Miguel de Cervantes.
Edson Amaro de Souza, professor do C. E. Trasilbo Filgueiras e do CIEP 415 Miguel de Cervantes.
domingo, 11 de abril de 2010
ABUSO DE PODER
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FAZ PEGADINHA COM A ENCHENTE!
Enquanto o povo gonçalense sofre, a atual administração parece divertir-se abusando do poder. Quem consultar o site da prefeitura, verá que há um texto dizendo que quarta e quinta-feira (7 e 8 de abril de 2010) serão dias de feriado escolar devido aos transtornos e desastres acarretados pelas fortes chuvas. Mas a Secretaria de Educação quer que os professores compareçam às escolas. Feriado só para os alunos. Quem duvidar, ligue para a Secretaria Municipal de Educação e pergunte. Pode até falar deste texto. Tels.: 2199-6510, 2199-6500 e 2199-6505.
Fica a pergunta: se a função dos professores é dar aula e se não há alunos na escola, o que eles ficarão fazendo? Até às 10: 50 da manhã, quando telefonei para lá, ninguém sabia a resposta. Quer dizer: primeiro forçam os trabalhadores a irem para as escolas, para depois pensar o que eles devem fazer (que não é tarefa deles). É isso que a panissetada chama de eficiência e competência?
Espero que nas escolas haja a obra completa de Machado de Assis para que os professores possam passar o tempo lendo nosso maior romancista. Ou que algum deles tenha um caderno e caneta para começar a escrever um livro enquanto perde seu tempo. Quem sabe um desses professores que sofrem hoje esse abuso poderá um dia chegar à Academia Brasileira de Letras?
Edson Amaro de Souza, diretor do SEPE (Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação), núcleo São Gonçalo
7 de abril de 2010.
Enquanto o povo gonçalense sofre, a atual administração parece divertir-se abusando do poder. Quem consultar o site da prefeitura, verá que há um texto dizendo que quarta e quinta-feira (7 e 8 de abril de 2010) serão dias de feriado escolar devido aos transtornos e desastres acarretados pelas fortes chuvas. Mas a Secretaria de Educação quer que os professores compareçam às escolas. Feriado só para os alunos. Quem duvidar, ligue para a Secretaria Municipal de Educação e pergunte. Pode até falar deste texto. Tels.: 2199-6510, 2199-6500 e 2199-6505.
Fica a pergunta: se a função dos professores é dar aula e se não há alunos na escola, o que eles ficarão fazendo? Até às 10: 50 da manhã, quando telefonei para lá, ninguém sabia a resposta. Quer dizer: primeiro forçam os trabalhadores a irem para as escolas, para depois pensar o que eles devem fazer (que não é tarefa deles). É isso que a panissetada chama de eficiência e competência?
Espero que nas escolas haja a obra completa de Machado de Assis para que os professores possam passar o tempo lendo nosso maior romancista. Ou que algum deles tenha um caderno e caneta para começar a escrever um livro enquanto perde seu tempo. Quem sabe um desses professores que sofrem hoje esse abuso poderá um dia chegar à Academia Brasileira de Letras?
Edson Amaro de Souza, diretor do SEPE (Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação), núcleo São Gonçalo
7 de abril de 2010.
terça-feira, 30 de março de 2010
Bento XVI e os pedófilos
O Brasil todo se lembra que, em 2009, uma menina de Recife foi estuprada pelo padrasto e ficou grávida. O bispo não tardou em excomungar o juiz que autorizou o aborto e a equipe médica que o realizou. Então o povo e a imprensa perguntaram: por que o Código Canônico não ordena a excomunhão dos estupradores? A atitude do papa lavando as mãos diante das denúncias de abuso sexual responde essa pergunta. Bento XVI está indo no caminho certo para se tornar o santo padroeiro dos pedófilos.
Edson Amaro de Souza, São Gonçalo, RJ.
Edson Amaro de Souza, São Gonçalo, RJ.
BEATRIZ LUGÃO SABE LER?
É a pergunta que me faço embora todos achem que sim, afinal de contas, ela tem curso superior e é professora de escola pública. Mas não é o que parece, se levarmos em conta as declarações que ela e seu grupo têm feito à categoria. No último dia 2 de março, terça-feira, durante a assembleia da rede municipal de São Gonçalo, alguém perguntou por que tinha surgido um boletim chamado NA LUTA PELA EDUCAÇÃO com o logotipo do SEPE. Dayse Oliveira muito bem respondeu que nós temos essa liberdade assim como todas as oposições sindicais de usar símbolos ou logotipos de um sindicato. É assim em todas as categorias. Dizem elas que nós queremos confundir a categoria, falando como se fôssemos direção. Disse isso no dia 7 de março, na plenária municipal do PSOL (Aliás, perguntem a qualquer militante do PSOL, que, se for honesto, confirmará que é uma prática recorrente dessa senhora ir contar a sua versão do que acontece no sindicato nos eventos do PSOL fazendo ela e o seu grupo de vítimas, pintando tudo com cores apocalípticas.). Eu prontamente me identifiquei como um dos autores do boletim e disse que explicaria a razão de ter surgido esse boletim paralelo, mas ela não teve coragem de ficar para ouvir a verdade. Todos são testemunhas de que eu anunciei que iria dar a minha versão dos fatos. E o fiz, junto com o companheiro Eduardo Manuel.
Pois bem, ou Beatriz Lugão é uma analfabeta funcional ou não é honesta, porque em momento algum do boletim NA LUTA PELA EDUCAÇÃO nós nos dizemos direção do SEPE – SÃO GONÇALO. Dizemos no texto QUEM SOMOS: “Somos diretores e militantes do SEPE/NÚCLEO SÃO GONÇALO. Constituímos o grupo “NA LUTA PELA EDUCAÇÃO”. E está tão claro que não falamos em nome da direção que dissemos: “Queremos uma direção que priorize o trabalho de base, a corrida às escolas e não a administração da sede como um clube.” “Queremos uma direção que respeite os fóruns da categoria concordando ou não com eles.” Então, para qualquer pessoa plenamente alfabetizada, está claro que, com esta fala, estamos discordando, dentro do nosso direito democrático, da maneira como o SEPE-SÃO GONÇALO está sendo conduzido pela ala majoritária da direção. E nem todos os que contribuíram com os textos do boletim são diretores. Mais: colocamos o endereço do blog que usamos durante o processo eleitoral do sindicato, quando compúnhamos a chapa 4, chapa essa que obteve 40% dos votos e, dentro do critério da proporcionalidade, teve direito a indicar diretores para o núcleo. Ao contrário do que elas dizem, não perdemos a eleição. Estamos constituindo a direção e dialogando com a categoria sobre os melhores rumos para o nosso sindicato.
O problema é que o grupo do qual ela faz parte não aceita ser questionado e não respeita a decisão da categoria que nos colocou lá dentro com 40% dos votos. Prova disso é que, numa das reuniões de direção de NOVEMBRO de 2009, a diretora Yara se disse no direito de não abrir a porta do sindicato para o diretor eleito Eduardo Manuel e para o militante Paulo Kautscher. Imediatamente, eu, Edson Amaro, exigi que tal declaração autoritária fosse registrada em ata. QUEM DUVIDAR LEIA AS ATAS DAS REUNIÕES DE DIREÇÃO DE NOVEMBRO DE 2009. Tanto assim que na primeira reunião da nova direção eleita, Beatriz Lugão teve o despudor de dizer que essa gestão seria um inferno, deixando, assim, claro que nós não éramos bem-vindos, nós, eleitos por 40% de militantes e filiados insatisfeitos com a maneira delas dirigirem o núcleo. Neste dia, morreram todo o respeito e a admiração que um dia eu tive por ela.
Mais: nosso boletim foi a melhor resposta à carta caluniosa que elas distribuíram contra nós.
Beatriz Lugão diz que nós queremos dividir a categoria num momento em que se prepara a união das centrais CONLUTAS e INTERSINDICAL. A bandeira dessa unificação já estava presente no discurso de nossa campanha. Só depois que partidos socialistas abraçaram essa causa é que elas passaram a falar a favor dessa unificação. E por falar em unificação, parece que elas querem nos igualar aos governos, pois, no boletim oficial do SEPE – SÃO GONÇALO, do qual não nos deixaram participar, dizem que “o governo, assim como nós, sabemos o que é melhor para a Educação”. Nós, quem? Quem de nós está tão distante do povo quanto o governo, a ponto de ter as mesmas ideias sobre o que nossa categoria e nossos alunos precisam? Não nos incluam nessa afirmação. Essa unificação com o governo nós não queremos.
Beatriz Lugão e seu grupo dizem que nós queremos dividir a categoria. Mas, durante as férias dos professores em janeiro, fomos nós que lembramos que nosso sindicato não é só de professores, mas também de funcionários (vigias, merendeiras, pessoal administrativo) que não têm férias juntamente com os professores. E que é durante essas férias que acontecem grandes ataques à categoria, como, por exemplo, o adiantamento que a prefeita Panisset fez e confundiu a categoria, endividando muitos. Apenas nosso grupo, que é a parte minoritária da direção, apareceu no SEPE nas tardes de terças e quintas de janeiro para ouvir os telefonemas dos filiados que nos procuravam. E fizemos isso com um caderno que nós mesmos compramos, pois nos impossibilitaram o uso do livro cotidiário. Então, quem é que está dividindo a categoria entre professores e o resto, quando se negam a fazer plantão durante as férias?
Outro fato que irrita a essa aprendiz de Stálin é o fato de nós termos um blog e uma comunidade na Internet, cujos endereços estão no nosso boletim, que têm milhares de acessos todos os meses e, com esse blog e com as conversas que temos com a categoria, obtemos emails e contatos de muitos filiados e educadores.
Termino meu texto por defender o princípio da proporcionalidade, alicerce da democracia no sindicato que, assim, garante a representatividade de minorias divergentes – não queremos ditadores comandando o SEPE e tratando a categoria como vaquinhas de presépio, rebanho de inocentes úteis ou dividindo-a entre nobres e plebeus, entre intelectuais e trabalhadores braçais, entre iluminados e intocáveis.
Caso não tenha gostado desse texto, senhora Beatriz Lugão, tenha a decência de me levar a uma comissão de ética. Se bem que eu não espero nenhuma atitude decente de sua pessoa. Se, por causa deste texto, você me levar a uma comissão de ética, terá, pela última vez em sua vida, os meus aplausos. E nunca mais me diga “bom dia”, pois isso nunca mais ouvirá de mim. Dói meu peito ao ver que tanta baixeza pratica quem deveria ser um modelo para a categoria e, como disse I-Juca Pirama (o herói do poema de Gonçalves Dias) ao defender sua honra e sua vida ante os timbiras, finalizo minha defesa dizendo: “Guerreiros, não coro / do pranto que choro. / Se a vida deploro / também sei morrer.”
Edson Amaro de Souza, diretor do SEPE-São Gonçalo.
Pois bem, ou Beatriz Lugão é uma analfabeta funcional ou não é honesta, porque em momento algum do boletim NA LUTA PELA EDUCAÇÃO nós nos dizemos direção do SEPE – SÃO GONÇALO. Dizemos no texto QUEM SOMOS: “Somos diretores e militantes do SEPE/NÚCLEO SÃO GONÇALO. Constituímos o grupo “NA LUTA PELA EDUCAÇÃO”. E está tão claro que não falamos em nome da direção que dissemos: “Queremos uma direção que priorize o trabalho de base, a corrida às escolas e não a administração da sede como um clube.” “Queremos uma direção que respeite os fóruns da categoria concordando ou não com eles.” Então, para qualquer pessoa plenamente alfabetizada, está claro que, com esta fala, estamos discordando, dentro do nosso direito democrático, da maneira como o SEPE-SÃO GONÇALO está sendo conduzido pela ala majoritária da direção. E nem todos os que contribuíram com os textos do boletim são diretores. Mais: colocamos o endereço do blog que usamos durante o processo eleitoral do sindicato, quando compúnhamos a chapa 4, chapa essa que obteve 40% dos votos e, dentro do critério da proporcionalidade, teve direito a indicar diretores para o núcleo. Ao contrário do que elas dizem, não perdemos a eleição. Estamos constituindo a direção e dialogando com a categoria sobre os melhores rumos para o nosso sindicato.
O problema é que o grupo do qual ela faz parte não aceita ser questionado e não respeita a decisão da categoria que nos colocou lá dentro com 40% dos votos. Prova disso é que, numa das reuniões de direção de NOVEMBRO de 2009, a diretora Yara se disse no direito de não abrir a porta do sindicato para o diretor eleito Eduardo Manuel e para o militante Paulo Kautscher. Imediatamente, eu, Edson Amaro, exigi que tal declaração autoritária fosse registrada em ata. QUEM DUVIDAR LEIA AS ATAS DAS REUNIÕES DE DIREÇÃO DE NOVEMBRO DE 2009. Tanto assim que na primeira reunião da nova direção eleita, Beatriz Lugão teve o despudor de dizer que essa gestão seria um inferno, deixando, assim, claro que nós não éramos bem-vindos, nós, eleitos por 40% de militantes e filiados insatisfeitos com a maneira delas dirigirem o núcleo. Neste dia, morreram todo o respeito e a admiração que um dia eu tive por ela.
Mais: nosso boletim foi a melhor resposta à carta caluniosa que elas distribuíram contra nós.
Beatriz Lugão diz que nós queremos dividir a categoria num momento em que se prepara a união das centrais CONLUTAS e INTERSINDICAL. A bandeira dessa unificação já estava presente no discurso de nossa campanha. Só depois que partidos socialistas abraçaram essa causa é que elas passaram a falar a favor dessa unificação. E por falar em unificação, parece que elas querem nos igualar aos governos, pois, no boletim oficial do SEPE – SÃO GONÇALO, do qual não nos deixaram participar, dizem que “o governo, assim como nós, sabemos o que é melhor para a Educação”. Nós, quem? Quem de nós está tão distante do povo quanto o governo, a ponto de ter as mesmas ideias sobre o que nossa categoria e nossos alunos precisam? Não nos incluam nessa afirmação. Essa unificação com o governo nós não queremos.
Beatriz Lugão e seu grupo dizem que nós queremos dividir a categoria. Mas, durante as férias dos professores em janeiro, fomos nós que lembramos que nosso sindicato não é só de professores, mas também de funcionários (vigias, merendeiras, pessoal administrativo) que não têm férias juntamente com os professores. E que é durante essas férias que acontecem grandes ataques à categoria, como, por exemplo, o adiantamento que a prefeita Panisset fez e confundiu a categoria, endividando muitos. Apenas nosso grupo, que é a parte minoritária da direção, apareceu no SEPE nas tardes de terças e quintas de janeiro para ouvir os telefonemas dos filiados que nos procuravam. E fizemos isso com um caderno que nós mesmos compramos, pois nos impossibilitaram o uso do livro cotidiário. Então, quem é que está dividindo a categoria entre professores e o resto, quando se negam a fazer plantão durante as férias?
Outro fato que irrita a essa aprendiz de Stálin é o fato de nós termos um blog e uma comunidade na Internet, cujos endereços estão no nosso boletim, que têm milhares de acessos todos os meses e, com esse blog e com as conversas que temos com a categoria, obtemos emails e contatos de muitos filiados e educadores.
Termino meu texto por defender o princípio da proporcionalidade, alicerce da democracia no sindicato que, assim, garante a representatividade de minorias divergentes – não queremos ditadores comandando o SEPE e tratando a categoria como vaquinhas de presépio, rebanho de inocentes úteis ou dividindo-a entre nobres e plebeus, entre intelectuais e trabalhadores braçais, entre iluminados e intocáveis.
Caso não tenha gostado desse texto, senhora Beatriz Lugão, tenha a decência de me levar a uma comissão de ética. Se bem que eu não espero nenhuma atitude decente de sua pessoa. Se, por causa deste texto, você me levar a uma comissão de ética, terá, pela última vez em sua vida, os meus aplausos. E nunca mais me diga “bom dia”, pois isso nunca mais ouvirá de mim. Dói meu peito ao ver que tanta baixeza pratica quem deveria ser um modelo para a categoria e, como disse I-Juca Pirama (o herói do poema de Gonçalves Dias) ao defender sua honra e sua vida ante os timbiras, finalizo minha defesa dizendo: “Guerreiros, não coro / do pranto que choro. / Se a vida deploro / também sei morrer.”
Edson Amaro de Souza, diretor do SEPE-São Gonçalo.
domingo, 28 de fevereiro de 2010
ABC do Poeta Dante Alighieri
ABC do Poeta Dante Alighieri
A história do poeta
Dante, o maior de Florença,
Vou cantar neste cordel
Para Vossa “Excelença”
Que eu sei que me ouvirá
Com respeito e “paciença”.
Beatriz foi a mulher
Que o amor lhe inspirou
Conforme na “Vida Nova”
O adolescente contou
Em versos apaixonados
Que a cidade consagrou.
Coube a Deus o final
Dessa história decidir
Quando à Sua excelsa Glória
Mandou a moça subir,
Deixando o triste poeta
Quase em prantos sucumbir.
Dante ao Inferno desceu
Tão dura foi a sua dor
De ver irrealizado
O seu sonho de amor.
Já adulto escreveu
Um poema inovador:
Essa “Divina Comédia”
Da Itália é a História
E também desse amor
Que não nos sai da memória;
Também de todo cristão
Que almeja entrar na Glória.
Foi no meio do caminho
De nossa vida tão dura
Que, por estrada errada,
Ele entrou na selva escura
Que antecede a entrada
Da infernal amargura.
Grande era a fé que ele tinha
Naquela Santa Luzia
A quem todo santo dia
Por sua vista pedia,
Tendo grande esperança
De que cego não morria.
Havia no Limbo um sábio
Que a Jesus não conheceu.
Era o poeta Virgílio
Que lá em Roma viveu,
Autor do poema “Eneida”,
Que o Dante tanto leu.
'Inda mais a Beatriz
Se dispôs a ajudar:
Resolveu que ao Inferno
Em pouco tempo ia baixar
Pra pedir que o Virgílio
Fosse a Dante auxiliar.
Já estava Dante ansioso
Para a Florença voltar
Quando Virgílio entre as sombras
Pôde se apresentar,
Dizendo que Beatriz
Ele iria avistar.
Lá no Limbo ela pediu-lhe
Que pelo Inferno o guiasse
E, subindo o Purgatório,
Em suas mãos o entregasse,
Pois lhe mostraria o Céu
Antes que à casa voltasse.
Medo é claro que teve
O poeta de lá entrar
E ficar sem esperança
De um dia retornar.
“Aqui – disse então Virgílio –
Todo o temor vai deixar”.
Na barca de Caronte entraram
Pra chegar ao outro mundo
E avistaram os covardes
Cobertos de enxame imundo
Sem merecer-lhes atenção
E seguiram rumo ao fundo.
"O poeta não morreu,
Foi ao Inferno e voltou”,
Como bem disse um roqueiro
Que a ele se comparou.
Mas também no Purgatório
Com Virgílio caminhou.
Personagens tantos viu,
Cada um com sua história,
Papas, reis, imperadores,
Antes cobertos de glória,
Sofrendo tanto e pedindo
Ao bom Deus misericórdia.
Quando ao Céu, enfim, chegou
Foi por mão de Beatriz.
Das belezas que lá viu
Nada o deixou mais feliz
Que o rosto de quem era
De seu peito imperatriz.
Radiante como toda
Dama a quem nos dedicamos,
Nunca destruindo o tempo
A beleza que lhes damos,
Pois não lhes cabe no corpo
E é na alma que a guardamos.
São Tomás encontrou logo
Entre os sábios descansando.
Lá seu bisavô cruzado,
Cacciaguida venerando,
Ao poeta revelou
Seu futuro miserando.
Também meu querido frei
São Francisco de Assis
Mereceu o seu lugar.
Nessa parte tão feliz
Um capítulo inteiro
Dedicar-lhe Dante quis.
Umbro foi de nascimento,
Universal pelo amor
Que aos homens e à natureza
Ensinou tal pregador.
A tudo renunciou
Pra servir ao Salvador.
Ver a Deus lá no Etéreo
Pôde o bardo ao final
Mas não pôde descrever
A perfeição do Imortal,
Vendo que tudo se move
Pelo amor do Deus Real.
Xi!, ouvinte meu tão caro,
Não me venha criticar
Essa história verdadeira
Que acabo de contar
Pois comigo e co’ a Itália
Inteirinha vai brigar.
Z é a letra final
Do alfabeto do cordel.
Pintei o melhor que pude,
Tendo os versos por pincel,
Este mural que retrata
Hades, Purgatório e Céu.
Iniciado em 27 de junho de 2002, findo em 5 de julho de 2004, entre Niterói e São Gonçalo, RJ.
A história do poeta
Dante, o maior de Florença,
Vou cantar neste cordel
Para Vossa “Excelença”
Que eu sei que me ouvirá
Com respeito e “paciença”.
Beatriz foi a mulher
Que o amor lhe inspirou
Conforme na “Vida Nova”
O adolescente contou
Em versos apaixonados
Que a cidade consagrou.
Coube a Deus o final
Dessa história decidir
Quando à Sua excelsa Glória
Mandou a moça subir,
Deixando o triste poeta
Quase em prantos sucumbir.
Dante ao Inferno desceu
Tão dura foi a sua dor
De ver irrealizado
O seu sonho de amor.
Já adulto escreveu
Um poema inovador:
Essa “Divina Comédia”
Da Itália é a História
E também desse amor
Que não nos sai da memória;
Também de todo cristão
Que almeja entrar na Glória.
Foi no meio do caminho
De nossa vida tão dura
Que, por estrada errada,
Ele entrou na selva escura
Que antecede a entrada
Da infernal amargura.
Grande era a fé que ele tinha
Naquela Santa Luzia
A quem todo santo dia
Por sua vista pedia,
Tendo grande esperança
De que cego não morria.
Havia no Limbo um sábio
Que a Jesus não conheceu.
Era o poeta Virgílio
Que lá em Roma viveu,
Autor do poema “Eneida”,
Que o Dante tanto leu.
'Inda mais a Beatriz
Se dispôs a ajudar:
Resolveu que ao Inferno
Em pouco tempo ia baixar
Pra pedir que o Virgílio
Fosse a Dante auxiliar.
Já estava Dante ansioso
Para a Florença voltar
Quando Virgílio entre as sombras
Pôde se apresentar,
Dizendo que Beatriz
Ele iria avistar.
Lá no Limbo ela pediu-lhe
Que pelo Inferno o guiasse
E, subindo o Purgatório,
Em suas mãos o entregasse,
Pois lhe mostraria o Céu
Antes que à casa voltasse.
Medo é claro que teve
O poeta de lá entrar
E ficar sem esperança
De um dia retornar.
“Aqui – disse então Virgílio –
Todo o temor vai deixar”.
Na barca de Caronte entraram
Pra chegar ao outro mundo
E avistaram os covardes
Cobertos de enxame imundo
Sem merecer-lhes atenção
E seguiram rumo ao fundo.
"O poeta não morreu,
Foi ao Inferno e voltou”,
Como bem disse um roqueiro
Que a ele se comparou.
Mas também no Purgatório
Com Virgílio caminhou.
Personagens tantos viu,
Cada um com sua história,
Papas, reis, imperadores,
Antes cobertos de glória,
Sofrendo tanto e pedindo
Ao bom Deus misericórdia.
Quando ao Céu, enfim, chegou
Foi por mão de Beatriz.
Das belezas que lá viu
Nada o deixou mais feliz
Que o rosto de quem era
De seu peito imperatriz.
Radiante como toda
Dama a quem nos dedicamos,
Nunca destruindo o tempo
A beleza que lhes damos,
Pois não lhes cabe no corpo
E é na alma que a guardamos.
São Tomás encontrou logo
Entre os sábios descansando.
Lá seu bisavô cruzado,
Cacciaguida venerando,
Ao poeta revelou
Seu futuro miserando.
Também meu querido frei
São Francisco de Assis
Mereceu o seu lugar.
Nessa parte tão feliz
Um capítulo inteiro
Dedicar-lhe Dante quis.
Umbro foi de nascimento,
Universal pelo amor
Que aos homens e à natureza
Ensinou tal pregador.
A tudo renunciou
Pra servir ao Salvador.
Ver a Deus lá no Etéreo
Pôde o bardo ao final
Mas não pôde descrever
A perfeição do Imortal,
Vendo que tudo se move
Pelo amor do Deus Real.
Xi!, ouvinte meu tão caro,
Não me venha criticar
Essa história verdadeira
Que acabo de contar
Pois comigo e co’ a Itália
Inteirinha vai brigar.
Z é a letra final
Do alfabeto do cordel.
Pintei o melhor que pude,
Tendo os versos por pincel,
Este mural que retrata
Hades, Purgatório e Céu.
Iniciado em 27 de junho de 2002, findo em 5 de julho de 2004, entre Niterói e São Gonçalo, RJ.
Um texto de Maquiavel, traduzido por mim
Ensaios Sobre a Primeira Década de Tito Lívio, Livro Terceiro, Capítulo XXIX
Que os pecados dos povos nascem dos príncipes.
Não se lamentem os príncipes de pecado algum cometido pelos povos que eles governam porque tais pecados nascem ou por negligência ou por estar o governante manchado por erros similares. E quem descrever os povos que, em nossos tempos, transbordam de roubalheiras e de semelhantes pecados verá que tudo terá nascido daqueles que os governam, que são de igual natureza.
A Romanha, antes que dela fossem eliminados pelo papa Alexandre VI aqueles senhores que a comandavam, era um exemplo de vidas celeradíssimas, pois lá se via por qualquer coisinha surgirem homicídios e rapinas grandíssimas. Isto nascia da baixeza daqueles príncipes, não da natureza baixa daqueles homens, como diziam. Porque, sendo aqueles príncipes pobres e querendo viver como ricos, tinham de recorrer a muitas rapinas e faziam-nas de diferentes maneiras; e uma dentre as muitas vias desonestas que trilhavam era fazerem leis que proibiam alguma coisa; depois, eram os primeiros que davam razão à sua inobservância e não puniam nunca os desobedientes senão quando viam que havia muitos envolvidos em tal falta, e então recorriam às punições, não porque zelassem pela lei, mas pela ganância de lucrarem com as penalidades . Disso nasciam muitos inconvenientes e sobretudo este: os povos se empobreciam e não se corrigiam e aqueles empobrecidos se empenhavam em se prevalecerem contra o menos influente deles. Disto surgiam todos aqueles males que acima mencionamos dos quais era culpado o príncipe.
Tito Lívio mostra que isto é verdade quando narra que, levando os legados romanos os despojos dos veienses a Apolo, foram aprisionados por corsários de Lipari e levados para a Sicília. Tendo Timasiteo, seu líder, perguntado que dádiva era aquela, para onde ia e quem a mandava, se portou, embora nascido em Lipari, como romano e mostrou ao povo o quanto era ímpio apoderar-se de tal oferenda, tanto que, com o consenso de todos, libertou os legados com suas coisas. E as palavras do historiador são estas: “Timasitheus multitudinem religiose implevit quae semper regenti est similis” . E Lorenzo de’ Medici, confirmando esta sentença, diz:
E quel che fa ‘l signor fanno poi molti,
ché nel signor son tutti gli occhi volti .
Que os pecados dos povos nascem dos príncipes.
Não se lamentem os príncipes de pecado algum cometido pelos povos que eles governam porque tais pecados nascem ou por negligência ou por estar o governante manchado por erros similares. E quem descrever os povos que, em nossos tempos, transbordam de roubalheiras e de semelhantes pecados verá que tudo terá nascido daqueles que os governam, que são de igual natureza.
A Romanha, antes que dela fossem eliminados pelo papa Alexandre VI aqueles senhores que a comandavam, era um exemplo de vidas celeradíssimas, pois lá se via por qualquer coisinha surgirem homicídios e rapinas grandíssimas. Isto nascia da baixeza daqueles príncipes, não da natureza baixa daqueles homens, como diziam. Porque, sendo aqueles príncipes pobres e querendo viver como ricos, tinham de recorrer a muitas rapinas e faziam-nas de diferentes maneiras; e uma dentre as muitas vias desonestas que trilhavam era fazerem leis que proibiam alguma coisa; depois, eram os primeiros que davam razão à sua inobservância e não puniam nunca os desobedientes senão quando viam que havia muitos envolvidos em tal falta, e então recorriam às punições, não porque zelassem pela lei, mas pela ganância de lucrarem com as penalidades . Disso nasciam muitos inconvenientes e sobretudo este: os povos se empobreciam e não se corrigiam e aqueles empobrecidos se empenhavam em se prevalecerem contra o menos influente deles. Disto surgiam todos aqueles males que acima mencionamos dos quais era culpado o príncipe.
Tito Lívio mostra que isto é verdade quando narra que, levando os legados romanos os despojos dos veienses a Apolo, foram aprisionados por corsários de Lipari e levados para a Sicília. Tendo Timasiteo, seu líder, perguntado que dádiva era aquela, para onde ia e quem a mandava, se portou, embora nascido em Lipari, como romano e mostrou ao povo o quanto era ímpio apoderar-se de tal oferenda, tanto que, com o consenso de todos, libertou os legados com suas coisas. E as palavras do historiador são estas: “Timasitheus multitudinem religiose implevit quae semper regenti est similis” . E Lorenzo de’ Medici, confirmando esta sentença, diz:
E quel che fa ‘l signor fanno poi molti,
ché nel signor son tutti gli occhi volti .
Jabuticabeira sem permissão
Têm muita razão aqueles que dizem: "Sejamos felizes mesmo sem permissão". Como acho que as vias públicas deveriam ter árvores frutíferas para que pássaros e cidadãos possam comer sem pagar e como as pessoas devem agir de acordo com o que pregam, sem perguntar a ninguém, resolvi plantar uma jabuticabeira em frente à minha casa, em plena rua.
Já coloquei num vaso uma semente de abacate e, quando a planta tiver mais de um metro, será plantada também em via pública.
Não podemos esperar que nossos desgovernantes cuidem do meio ambiente e de nosso bem-estar.
Já coloquei num vaso uma semente de abacate e, quando a planta tiver mais de um metro, será plantada também em via pública.
Não podemos esperar que nossos desgovernantes cuidem do meio ambiente e de nosso bem-estar.
domingo, 17 de janeiro de 2010
Cordel da luta de classes
Cordel da Luta de Classes
Autor: Edson Amaro de Souza
Vim dizer o que não sabe
Muita gente hoje em dia
Que pensa que se celebra
Somente por cortesia
Dois dias cuja história
Há muito não se dizia.
O oito de março, mulheres,
A vocês é consagrado
E vocês tanto merecem
Que devia ser feriado
Mas ninguém lhes conta nunca
Da história o pior lado.
A mídia só lhes retrata
Como mães, consumidoras,
Amantes, esposas, filhas,
Por isso merecedoras
De que o filho ou o marido
Lhes dê nova lavadora.
O Mercado em tudo manda
Como nova divindade
E nos nega o que somos:
Nossa própria humanidade!
E quem disso se esqueceu
Serve-o mesmo sem vontade.
O Mercado não quer homens
Nem mulheres por inteiro:
Quer só as mãos que trabalhem
Pra ele _ parasiteiro! _
E estômagos que além
Da fome tenham dinheiro.
Em Nova Iorque no ano
Mil oitocentos e mais
Cinqüenta e sete janeiros,
Por trabalharem demais,
Cento e vinte nove vozes
Femininas, valentais,
Ergueram-se então contra
Jornada tão desumana:
Dezesseis horas diárias
Tão mal pagas que nem Joana
D’Arc, que era santa e guerreira,
Agüentaria uma semana!
A mulher sempre é valente
Quando toma a dianteira.
As heróicas operárias,
Exemplos pra Terra inteira,
Mandou o Capitalismo
Que morressem na fogueira.
E, no Primeiro de Maio,
Dia do Trabalhador,
O que faz a burguesia,
Hoje em dia, causa horror:
Sorteios, festas e shows
Pra mentiras bem compor!
Não sabe quem se alegra
Nesse dia feriado
Que, em Chicago, há mais de um século,
Quanto sangue derramado!
“Jornada de doze horas?!
Com oito se está cansado!”
Assim diziam os grevistas
Em pacífica passeata.
Mas outra vez os seus patrões
Fazem uso da chibata:
A polícia, a mando deles,
Espanca, prende e até mata!
Fundada em Paris, a
Segunda Internacional
Socialista, operários,
Relembrando a tão fatal
Data de três anos antes,
Decidiram ao final
Celebrarem os oprimidos,
Em escala mundial,
A memória dos caídos
Nessa luta desigual
Dos proletários sem armas
Contra o aço do Capital.
Os capitalistas queriam
Apagar essa história
E perseguiam aqueles
Que a tinham na memória.
Era preciso enfrentar
Tal violência inibitória.
Todo ano tinha greve
Pra lembrar a triste data
E falar contra a riqueza
Que os pobres só maltrata,
Porque deles tira ouro
E lhes dá em troca lata.
No Brasil, foi a cidade
De Santos a primeira
A desistir de calar
A lembrança justiceira
Quando sindicatos ‘inda
Proibia a lei brasileira.
Isso foi dez anos antes
De, na longe Rússia fria,
Os pobres se organizarem
Com ciência e valentia
E criarem um novo Estado
Pra acabar com a mais-valia.
Marx e Lênin ensinaram
Pra gente do mundo todo
Que somente se unindo
Os pobres saem do lodo
Mas antes têm de vencer
O ideológico engodo.
Também disse Paulo Freire,
Pedagogo do Oprimido,
Que se tornar opressor
O oprimido faz sentido
Somente pra quem não quer
Ver o mundo redimido.
Vejam vocês os sem-terra
Organizado movimento,
Sementes do novo dia,
Do qual vejo o nascimento,
Quando a terra então a todos
Dará cultura e sustento.
Professores, operários,
Camponeses e atores,
Não é em vão esta história
Tatuada de mil dores:
Nos unamos para sermos
Dela continuadores.
Outro mundo nossas mãos
São capazes de criar.
Desemprego, guerra e fome
Não são frutos do azar:
Existem somente pro
Capital se sustentar.
No mundo socialista
Que devemos construir,
Haverá mais verde e menos
Razões para poluir.
Fronteiras entre os países
Deixarão de existir.
Homens e mulheres, brancos
E negros, todos iguais
Em direitos e deveres,
Preconceitos nunca mais!
É preciso respeitar
Também homossexuais.
Todos somos explorados
E, para isso acabar,
Respeitemos as diferenças
De sexo, raça ou falar!
É de mãos dadas que sempre
Nós devemos caminhar!
Em Porto Alegre, todo ano,
Gente do mundo inteiro
Faz um Fórum onde o Homem
Vale mais do que o dinheiro,
Diferente do de Davos,
Fortaleza de banqueiro.
Lá trocam experiências,
Denunciam a opressão,
Discutem idéias novas
No meio da multidão
Pra que todos possam dar
Qualquer colaboração.
Obrigado a Che Guevara
E às Mães da Argentina,
Exemplo de inteligência
Misturada à adrenalina
E a Martin Luther King
Minha mais sincera estima.
Obrigado a todos que
Combatem o capitalismo.
Cada um com seu tijolo,
Construindo o Socialismo,
Pratica o verdadeiro
Ideal do Humanismo.
Escrito em São Gonçalo, RJ, nos dias 27 a 28 de julho de 2004, ano do centenário do poeta Pablo Neruda, autor de “Canto Geral”.
Autor: Edson Amaro de Souza
Vim dizer o que não sabe
Muita gente hoje em dia
Que pensa que se celebra
Somente por cortesia
Dois dias cuja história
Há muito não se dizia.
O oito de março, mulheres,
A vocês é consagrado
E vocês tanto merecem
Que devia ser feriado
Mas ninguém lhes conta nunca
Da história o pior lado.
A mídia só lhes retrata
Como mães, consumidoras,
Amantes, esposas, filhas,
Por isso merecedoras
De que o filho ou o marido
Lhes dê nova lavadora.
O Mercado em tudo manda
Como nova divindade
E nos nega o que somos:
Nossa própria humanidade!
E quem disso se esqueceu
Serve-o mesmo sem vontade.
O Mercado não quer homens
Nem mulheres por inteiro:
Quer só as mãos que trabalhem
Pra ele _ parasiteiro! _
E estômagos que além
Da fome tenham dinheiro.
Em Nova Iorque no ano
Mil oitocentos e mais
Cinqüenta e sete janeiros,
Por trabalharem demais,
Cento e vinte nove vozes
Femininas, valentais,
Ergueram-se então contra
Jornada tão desumana:
Dezesseis horas diárias
Tão mal pagas que nem Joana
D’Arc, que era santa e guerreira,
Agüentaria uma semana!
A mulher sempre é valente
Quando toma a dianteira.
As heróicas operárias,
Exemplos pra Terra inteira,
Mandou o Capitalismo
Que morressem na fogueira.
E, no Primeiro de Maio,
Dia do Trabalhador,
O que faz a burguesia,
Hoje em dia, causa horror:
Sorteios, festas e shows
Pra mentiras bem compor!
Não sabe quem se alegra
Nesse dia feriado
Que, em Chicago, há mais de um século,
Quanto sangue derramado!
“Jornada de doze horas?!
Com oito se está cansado!”
Assim diziam os grevistas
Em pacífica passeata.
Mas outra vez os seus patrões
Fazem uso da chibata:
A polícia, a mando deles,
Espanca, prende e até mata!
Fundada em Paris, a
Segunda Internacional
Socialista, operários,
Relembrando a tão fatal
Data de três anos antes,
Decidiram ao final
Celebrarem os oprimidos,
Em escala mundial,
A memória dos caídos
Nessa luta desigual
Dos proletários sem armas
Contra o aço do Capital.
Os capitalistas queriam
Apagar essa história
E perseguiam aqueles
Que a tinham na memória.
Era preciso enfrentar
Tal violência inibitória.
Todo ano tinha greve
Pra lembrar a triste data
E falar contra a riqueza
Que os pobres só maltrata,
Porque deles tira ouro
E lhes dá em troca lata.
No Brasil, foi a cidade
De Santos a primeira
A desistir de calar
A lembrança justiceira
Quando sindicatos ‘inda
Proibia a lei brasileira.
Isso foi dez anos antes
De, na longe Rússia fria,
Os pobres se organizarem
Com ciência e valentia
E criarem um novo Estado
Pra acabar com a mais-valia.
Marx e Lênin ensinaram
Pra gente do mundo todo
Que somente se unindo
Os pobres saem do lodo
Mas antes têm de vencer
O ideológico engodo.
Também disse Paulo Freire,
Pedagogo do Oprimido,
Que se tornar opressor
O oprimido faz sentido
Somente pra quem não quer
Ver o mundo redimido.
Vejam vocês os sem-terra
Organizado movimento,
Sementes do novo dia,
Do qual vejo o nascimento,
Quando a terra então a todos
Dará cultura e sustento.
Professores, operários,
Camponeses e atores,
Não é em vão esta história
Tatuada de mil dores:
Nos unamos para sermos
Dela continuadores.
Outro mundo nossas mãos
São capazes de criar.
Desemprego, guerra e fome
Não são frutos do azar:
Existem somente pro
Capital se sustentar.
No mundo socialista
Que devemos construir,
Haverá mais verde e menos
Razões para poluir.
Fronteiras entre os países
Deixarão de existir.
Homens e mulheres, brancos
E negros, todos iguais
Em direitos e deveres,
Preconceitos nunca mais!
É preciso respeitar
Também homossexuais.
Todos somos explorados
E, para isso acabar,
Respeitemos as diferenças
De sexo, raça ou falar!
É de mãos dadas que sempre
Nós devemos caminhar!
Em Porto Alegre, todo ano,
Gente do mundo inteiro
Faz um Fórum onde o Homem
Vale mais do que o dinheiro,
Diferente do de Davos,
Fortaleza de banqueiro.
Lá trocam experiências,
Denunciam a opressão,
Discutem idéias novas
No meio da multidão
Pra que todos possam dar
Qualquer colaboração.
Obrigado a Che Guevara
E às Mães da Argentina,
Exemplo de inteligência
Misturada à adrenalina
E a Martin Luther King
Minha mais sincera estima.
Obrigado a todos que
Combatem o capitalismo.
Cada um com seu tijolo,
Construindo o Socialismo,
Pratica o verdadeiro
Ideal do Humanismo.
Escrito em São Gonçalo, RJ, nos dias 27 a 28 de julho de 2004, ano do centenário do poeta Pablo Neruda, autor de “Canto Geral”.
terça-feira, 12 de janeiro de 2010
Tributo a Miep Gies
Cara sra. Miep Gies,
Quando se fala em Literatura infanto-juvenil, quase sempre trata-se de livros escritos para crianças e adolescentes por mãos adultas. São pouquíssimos, em todas as línguas, os livros escritos por jovens. Deste, o mais importante é, certamente, O "Diário de Anne Frank", uma obra da qual eu nunca consigo falar em sala de aula com meus alunos sem que meus olhos se inundem de lágrimas. Eu li já adulto, em meus tempos de faculdade, na Universidade Federal Fluminense e tenho agora, ao alcance da mão, um exemplar velhinho da adaptação que os americanos Frances Goodrich e Albert Hackett fizeram para o teatro (Tradução de Gert Meyer, Rio de Janeiro: Editora Agir, 1975. Nem sei se ainda é publicada.). Comprei o livrinho em um sebo e não sei quantas vezes já o reli e, ao terminar, meus olhos sempre estão encharcados.
Não creio que haja melhor leitura para os corações e as mentes adolescentes em formação. Acho que somente os Evangelhos têm um apelo tão forte para a solidariedade. Acho mesmo que, se Cristo tivesse de ir a uma livraria, seria para comprar um exemplar desse livro. Se Gandhi fosse ao teatro, seria para ver essa peça. Quem ama a paz deve conhecer essa obra e recomendá-la por onde andar.
E neste 11 de janeiro de 2010, o seu generoso coração, sra. Miep, parou de bater. Ao ler e reler essa peça, fico pensando, sra. Miep, quanto lhe custou em coragem, em despesas a nobre intenção da sra. e do sr. Kraler e daquelas outras pessoas amigas em acolher aquelas oito vidas judias, sentenciadas à morte pelo simples “crime” de existirem. E aos 100 anos de idade a senhora deixa esse planeta, que precisa tanto de gente assim corajosa e solidária. Essa sua longevidade me faz pensar que fazer o bem aos outros deve fazer bem à saúde...
No livro de Anne Frank, chamam a atenção as diferenças que encontram harmonicamente. Cristãos celebrando o Hanukkah junto com os judeus que abrigam, judeus pela primeira vez celebrando o Natal com os cristãos que os acolhem. Na peça, que exige uma ação permanente para não enfadar os espectadores, são mais intensos os conflitos: o confinamento, a pouca comida sendo a duras penas dividida, as personalidades que se chocam. E também a descoberta do amor entre os adolescentes Anne e Peter. Ele, um garoto tímido que se esquiva das discussões em companhia do seu gato e que, a princípio, é desprezado por Anne; ela, a garota sonhadora que sonha em crescer e ser escritora, contar, velhinha, a seus netos o difícil período do esconderijo. São o otimismo de Anne, sua alegria inquebrantável, seus projetos esmagados pela crueldade nazista que nos encantam, nos comovem e nos entristecem quando fechamos o livro e lembramos seu fim prematuro.
A frase mais célebre escrita por Anne, presente no diário e na peça, é: “Apesar de tudo, continuo acreditando na bondade humana.” A peça começa quando o sr. Frank, único sobrevivente, volta ao esconderijo após terminada a guerra e a senhora, cara Miep, lhe entrega o diário. Ele o lê para o público, que assiste à reconstituição daquela difícil convivência, e, ao final, ele conta como a família foi conduzida aos campos de extermínio – apesar de tudo, Anne sorria porque, enfim, sentia o Sol e a brisa após dois anos de reclusão –, separada e exterminada, pouco antes do fim da derrota do nazismo. A peça se encerra quando o sr. Frank relê a frase imortal e declara sobre a otimista filha aniquilada: “Ela me faz sentir pequeno.”
Faço minhas as palavras do sr. Frank. Sinto-me pequeno diante do talento precoce e do otimismo de Anne Frank e também da sua generosidade e da sua coragem, sra. Miep Gies. E fico imaginando se, neste exato momento, na Palestina oprimida pelo estado israelense, que copia a crueldade dos nazistas, não há um coração corajoso e generoso como o seu, acolhendo famílias ameaçadas por um Estado genocida, e, quem sabe, um dia, quando os palestinos tiverem seu próprio Estado, sua sobrevivência assegurada, veremos surgir um diário escrito por uma adolescente palestina, uma nova Anne testemunhando o holocausto de hoje.
Obrigado, Sra. Miep, por entregar à juventude "O Diário de Anne Frank". Descanse em paz.
Edson Amaro é licenciado em Letras pela Universidade Federal Fluminense, professor da rede estadual do Rio de Janeiro e diretor do núcleo São Gonçalo do SEPE – Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação.
Quando se fala em Literatura infanto-juvenil, quase sempre trata-se de livros escritos para crianças e adolescentes por mãos adultas. São pouquíssimos, em todas as línguas, os livros escritos por jovens. Deste, o mais importante é, certamente, O "Diário de Anne Frank", uma obra da qual eu nunca consigo falar em sala de aula com meus alunos sem que meus olhos se inundem de lágrimas. Eu li já adulto, em meus tempos de faculdade, na Universidade Federal Fluminense e tenho agora, ao alcance da mão, um exemplar velhinho da adaptação que os americanos Frances Goodrich e Albert Hackett fizeram para o teatro (Tradução de Gert Meyer, Rio de Janeiro: Editora Agir, 1975. Nem sei se ainda é publicada.). Comprei o livrinho em um sebo e não sei quantas vezes já o reli e, ao terminar, meus olhos sempre estão encharcados.
Não creio que haja melhor leitura para os corações e as mentes adolescentes em formação. Acho que somente os Evangelhos têm um apelo tão forte para a solidariedade. Acho mesmo que, se Cristo tivesse de ir a uma livraria, seria para comprar um exemplar desse livro. Se Gandhi fosse ao teatro, seria para ver essa peça. Quem ama a paz deve conhecer essa obra e recomendá-la por onde andar.
E neste 11 de janeiro de 2010, o seu generoso coração, sra. Miep, parou de bater. Ao ler e reler essa peça, fico pensando, sra. Miep, quanto lhe custou em coragem, em despesas a nobre intenção da sra. e do sr. Kraler e daquelas outras pessoas amigas em acolher aquelas oito vidas judias, sentenciadas à morte pelo simples “crime” de existirem. E aos 100 anos de idade a senhora deixa esse planeta, que precisa tanto de gente assim corajosa e solidária. Essa sua longevidade me faz pensar que fazer o bem aos outros deve fazer bem à saúde...
No livro de Anne Frank, chamam a atenção as diferenças que encontram harmonicamente. Cristãos celebrando o Hanukkah junto com os judeus que abrigam, judeus pela primeira vez celebrando o Natal com os cristãos que os acolhem. Na peça, que exige uma ação permanente para não enfadar os espectadores, são mais intensos os conflitos: o confinamento, a pouca comida sendo a duras penas dividida, as personalidades que se chocam. E também a descoberta do amor entre os adolescentes Anne e Peter. Ele, um garoto tímido que se esquiva das discussões em companhia do seu gato e que, a princípio, é desprezado por Anne; ela, a garota sonhadora que sonha em crescer e ser escritora, contar, velhinha, a seus netos o difícil período do esconderijo. São o otimismo de Anne, sua alegria inquebrantável, seus projetos esmagados pela crueldade nazista que nos encantam, nos comovem e nos entristecem quando fechamos o livro e lembramos seu fim prematuro.
A frase mais célebre escrita por Anne, presente no diário e na peça, é: “Apesar de tudo, continuo acreditando na bondade humana.” A peça começa quando o sr. Frank, único sobrevivente, volta ao esconderijo após terminada a guerra e a senhora, cara Miep, lhe entrega o diário. Ele o lê para o público, que assiste à reconstituição daquela difícil convivência, e, ao final, ele conta como a família foi conduzida aos campos de extermínio – apesar de tudo, Anne sorria porque, enfim, sentia o Sol e a brisa após dois anos de reclusão –, separada e exterminada, pouco antes do fim da derrota do nazismo. A peça se encerra quando o sr. Frank relê a frase imortal e declara sobre a otimista filha aniquilada: “Ela me faz sentir pequeno.”
Faço minhas as palavras do sr. Frank. Sinto-me pequeno diante do talento precoce e do otimismo de Anne Frank e também da sua generosidade e da sua coragem, sra. Miep Gies. E fico imaginando se, neste exato momento, na Palestina oprimida pelo estado israelense, que copia a crueldade dos nazistas, não há um coração corajoso e generoso como o seu, acolhendo famílias ameaçadas por um Estado genocida, e, quem sabe, um dia, quando os palestinos tiverem seu próprio Estado, sua sobrevivência assegurada, veremos surgir um diário escrito por uma adolescente palestina, uma nova Anne testemunhando o holocausto de hoje.
Obrigado, Sra. Miep, por entregar à juventude "O Diário de Anne Frank". Descanse em paz.
Edson Amaro é licenciado em Letras pela Universidade Federal Fluminense, professor da rede estadual do Rio de Janeiro e diretor do núcleo São Gonçalo do SEPE – Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação.
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