sexta-feira, 10 de setembro de 2010

A farra dos livros

Só agora, aos 33 anos, estou lendo “A Origem das Espécies”, um dos livros mais importantes de nossa civilização e estou me deliciando com o estilo de Darwin, elegante e acessível ao leitor mediano, repleto de questionamentos sobre a antiga Biologia, calcada no mito da Criação e no fixismo da natureza. Lá pelo terceiro capítulo comecei a pensar: por que não entregar um exemplar dessa obra a cada estudante do país?
As razões são duas: uma para não irritar as igrejas que, na encolha, reconhecem os méritos desse homem que mudou todo o pensamento científico, mas que, à luz do sol, continuam contando aos fiéis a velha fábula do Éden como se fosse fato histórico e não a fábula que é. Isso porque estão comprometidas com a manutenção de tudo o que é velho; porque vendem a mentira da eternidade das instituições, embora, dentro de seus próprios templos, não haja mais espaço para a eternidade, como havia naquelas magníficas catedrais medievais que levavam séculos para ficarem prontas e abrigavam em seu interior os túmulos dos ilustres, a espera da ressurreição que nunca vem; porque dar aos fiéis a liberdade de questionar uma única página da Bíblia seria abrir caminho para que o livro todo fosse questionado e então, o que seria dos curas e de suas sinecuras?
A outra razão é que o capitalismo, embora se diga eterno, é inimigo de tudo o que é perene. Vivemos a civilização do descartável, a arte celebra “a maior banda de todos os tempos da última semana” e a ambição maior da indústria automobilística é inventar o carro de papel, para que seja trocado a cada chuva.
Por isso, a cada três anos, nós, professores, somos convocados a eleger os novos livros didáticos de cada matéria e são permitidas às editoras coisas que não se permitem aos candidatos aos poderes Executivo e Legislativo. E, como a cada ano, elegem-se os livros de uma ou duas matérias, todos os anos cataratas de dinheiro público são gastos em livros descartáveis, que pouco ou nada contribuem para apresentar aos nossos jovens as grandes realizações da Arte, da Ciência e da Filosofia.
Acho que, ao invés de tantos livros efêmeros, seria melhor entregar aos jovens obras duradouras em domínio público: no último ano do Ensino Fundamental ou no primeiro do Ensino Médio, entregar-lhes uma boa tradução de “A Origem das Espécies” e mais nada para o estudo da Biologia nesse ano; ninguém deveria concluir o 9º ano sem conhecer ao menos um Sermão do Padre Vieira, um romance de José de Alencar e outro de Machado de Assis; ninguém deveria ingressar na Universidade sem ter lido “Os Lusíadas” inteiro; por que terminar o Ensino Fundamental sem ler “Declínio e Queda do Império Romano”, de Gibbon, no curso de História e “A República”, de Platão e os “Ensaios”, de Montaigne e “O Contrato Social”, de Rousseau nas aulas de Filosofia ou Sociologia? Para que os alunos se sentissem seguros de conhecer uma língua estrangeira, que se lhes entregasse um romance de Jane Austen onde se lecionasse Inglês, um de Alexandre Dumas ou de Flaubert onde se optasse pelo Francês, as “Novelas Exemplares”, de Cervantes no caso do Espanhola ou mesmo as peças de García Lorca.
Caramba! Falei o nome de Lorca. Vão achar que eu sou comunista. E sou mesmo. Só mesmo um comunista para desejar tanta leitura séria num país em que a escola pública forma analfabetos funcionais. E a privada? Será que estimula o pensamento crítico?

Um comentário:

  1. Edson, não poderia concordar mais com vc!!!!!
    E AINDA existem pais que colocam filhos em escolas que "pregam" (hauhauahh, adoro essa palavra) o criacionismo!!!


    Cruzes!!!!!Bjos!!!
    Já atachei seu blog no meu!!!!!!

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