sábado, 30 de outubro de 2010

Thomas Morus

Sou apaixonado por palavras. Gosto de ler um bom texto. Não importa a sua ideologia. Gosto de produzir bons textos e quando traduzo nem sempre concordo com tudo quanto traduzo. Mas traduzir um bom texto é um enorme prazer e me sinto amigo dos autores a quem traduzo, e não concordamos com tudo que nossos amigos dizem ou pensam.
Dia 29 de outubro estive na SBAT (Sociedade Brasileira de Autores Teatrais) para arquivar a tradução que fiz da peça "Thomas Morus", de Silvio Pellico (1789 - 1954).
A peça é comovente. Trata dos últimos dias de Thomas Morus, o filósofo autor de "A Utopia", que foi decapitado por não transigir com suas convicções católicas quando Henrique VIII fundou a Igreja Anglicana. Por isso, João Paulo II, em seus últimos dias, proclamou santo protetor dos políticos. Bem, a memória do papa não andava muito boa, pois, em "A Utopia", Morus defende algumas ideias que o Vaticano condena, como a eutanásia...
Falar de religião é falar de sangue, de matança, pois a História das Religiões é a História da Intolerância e da Carnificina. Jorge Amado disse que as terras do sul da Bahia, onde se plantava cacau, são fertilíssimas porque adubadas com sangue humano, adubo sem igual. Se esse adubo for tão eficiente assim, ainda mais férteis são as terras europeias, tal a quantidade de sangue que católicos e protestantes derramaram por lá.
É claro que eu preferiria uma tragédia que não tomasse partido nem pelos católicos nem pelos protestantes, que são Montechios e Capuletos com discursos teológicos; uma tragédia como "In Nomine Dei" de Saramago. Mas embora o texto de Silvio Pellico seja explicitamente católico, não deixa de comover o carinho extremado de Margaret por seu pai (várias vezes os dois personagens me fizeram chorar enquanto traduzia) e é admirável a coragem de Morus que, por três vezes, recusa a liberdade que lhe é oferecida. E num momento em que o fanatismo religioso ganha cada vez mais espaço no Parlamento brasileiro, todos os textos que lembrem o quanto de sangue que já se derramou em nome de Deus para derrotar o Diabo (que, se existisse, processaria todas as igrejas por calúnia e difamação) merecem ser lidos e representados.

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